terça-feira, 8 de março de 2011

Dia internacional da mulher

Hoje, dia 8 de março,após persistente luta feminina por seus direitos que culminou em 1857, quando 129 operárias têxteis de Nova York ,em greve pela redução de sua jornada de trabalho, foram queimadas quando a fábrica foi incendiada, comemoramos o Dia Internacional da Mulher
   Para me unir a esta comemoração, abordo aqui o tema “Mulher!” tentando  abordar nele  o papel da mulher dentro da ascensão de algumas sociedades e religiões . 
   Nos primórdios da civilização até aonde lembramos as eras mais arcaicas,vivia-se num sistema social de matriarcado. Nele ,a força feminina era bastante valorizada. A mulher simbolizava a grande mãe, a mantenedora da fertilidade do solo. Como não havia consciência de que a maternidade provinha do relacionamento entre sexos, a vida então originava-se toda dela, da Deusa. Ela mantinha os mistérios da vida.O culto à Grande deusa era a única religião. As comunidades cresciam  em um sistema coletivo onde todos os nomes de deusa menores eram cultuados.Eram mantidas relações de fraternidade entre as tribos matriarcais pois todas as deusas , representavam os atributos diversificados da grande mãe.
   Quando aconteceram as invasões de tribos com tendências autoritárias e guerreiras, o poder da Grande Deusa e consequentemente da mulher começou  a diminuir. Introduzia-se o Patriarcado. Porém, este foi um processo muito lento pois por séculos o poder feminino, com uma característica de mistério e sacralidade, ainda perdurou.Assim, vemos os Celtas Druidas da antiga Gália, ainda poucos séculos antes da era cristã seguirem denominando-se os Tuatha de Danã, ou Povo de Ana,   a grande Mãe e adorando Karentz a força cósmica feminina.Cultuavam-na num grande Menir em forma de porta que representava o útero feminino.Em seus ritos todos os Druidas passavam abaixados através deste Menir-porta,num simbolismos dos nascimentos que faziam através de seu útero.         

   Mesmo nas sociedades onde o homem já era o rei, o chefe da tribo, para que ele pudesse obter a sua soberania, precisava ser consagrado num ritual pela força divina feminina. Ele fazia um casamento sagrado com a mãe terra onde recebia o título de irmão consorte da Deusa.Chamava-se este rito de” Incesto sagrado “.Em alguns ritos , o rei necessitava   ejacular o seu esperma sobre a  terra para que tal casamento se consolidasse.
      Muitos povos antigos como os Incas e Maias, ainda guardando um respeito  por  este  grande  poder  feminino, conservaram    por     séculos o costume da Libação. Esta consistia em não ingerir qualquer líquido fosse ele vinho, óleos ou sucos sem antes despejar um pouco sobre o solo como uma reverência à Mãe Terra, mostrando-lhe o que fora capaz de fazer com o alimento que ela lhe dera.
    Também gregos e romanos ainda por séculos mantiveram templos para as suas vestais, guardadoras do fogo sagrado dos lares e das cidades.
   Adoraram musas inspiradoras da música e da poesia e as pitonisas que, com seus inigualáveis dons mágicos de profecias, atraiam para a Grécia consulentes de todos os povos  circunvizinhos, levando riquezas ao país.É verdade que pelo poder já masculino , tais dons femininos eram explorados, como no caso das vestais que por qualquer deslize sexual eram mortas pelo estado romano. Porém, por séculos, reis poderosos se dobraram ante suas previsões sagradas para terem sucesso em suas campanhas guerreiras.
    Só a entrada das religiões monoteístas pôs uma pá de cal sobre o antigo poder espiritual feminino, mormente o Cristianismo .A única exceção feita ao paganismo de teor feminino  pelo Cristianismo se deu quando uma pitonisa profetizou a chegada de um grande iluminado que poria fim as antigas crenças. Como a Igreja o identificou à figura de Jesus,o Cristianismo abriu as portas as imagens artísticas das pitonisas o que propiciou, bem mais tarde na época da Renascença, termos as magníficas figuras das pitonisas pintadas por Miguel Ângelo na capela do Vaticano .
    Nos primeiros séculos do Cristianismo , a Igreja ignorou completamente a mulher. Apesar de algumas mulheres tais como a negra Sara(hoje cultuada pelos ciganos provençais), Marta e Maria Madalena terem atravessado o Mediterrâneo para pregar a mensagem crística na Provençe, tal como nos contam as suas tradições locais, a Igreja  seguiu apresentando a mulher como o símbolo demoníaco do pecado, assegurando aquela velha idéia bíblica de que a mulher foi responsável pelo homem ter perdido o paraíso. Os Concílios Eucumênicos  realizados nos primeiros séculos de nossa era instituíram os dogmas da Virgindade e da Ascensão de Maria , temas femininos que, porém, em sendo dogmas, proibiam qualquer estudo a respeito dos trabalhos da mulher, sob pena de heresia.
   Porém, no sec. XIII, veio o advento dos Trovadores de Provençe , e  o tema mulher foi novamente levantado .O tratamento à mulher  foi renovado com o chamado Amor Cortez.   Também o aparecimento da doutrina    Cátara,crescendo e dando as mulheres acesso as suas iniciações contribuiu para uma reação da Igreja. Esta então buscou  a figura da Virgem Maria  para homenageá-la, e o culto Mariano cresceu sobremaneira .Enalteceu-a então sempre como a” mater dolorosa”, que presenciou a crucificação de um filho  e nunca com qualquer participação ativa no trabalho desenvolvido por Ele. Hoje estudos espiritualistas afirmam que tanto São José como a Virgem eram iniciados da Fraternidade  Essênia  da  Judéia.        Que ambos levaram seu filho Jesus a templos essênios do Egito. Porém, na Idade Média tais afirmações  seriam naturalmente abafadas e perseguidas.
    Durante séculos o casamento  de meninas crianças com reis e nobres serviam as questões políticas, e muitos nobres ambiciosos obrigaram suas filhas meninas a se prostituirem tornando-se favoritas dos reis para a ascensão social da família. Um bom exemplo disto é o da família inglesa dos Bolena, instigando suas duas filhas a serem as favoritas de Henrique VIII.
    No século XVII os ritos do Sabath de bruxarias se espalharam com a participação das mulheres. Os sabath  eram apenas recursos ingênuos com que as mulheres tentavam reagir e se vingarem da opressão em que viviam. Foi então desencadeada a chamada ” caça às bruxas”  uma onda inimaginável de perseguição à mulher., onde milhares delas foram queimadas.
    Somente no século XVIII, quando o poder da igreja foi igualado e até superado por outros poderes emergentes como a industrialização e a ciência,  o papel da mulher iniciou seu processo de reestruturar-se.
    A Maçonaria ,grande poder político,que  por séculos conservou  uma omissão a respeito da mulher,  iniciou sua reabilitação no final do século XIX ,criando a  Ordem Maçônica Místa Internacional  e várias lojas femininas, embora ainda hoje algumas lojas masculinas continuam presas a costumes seculares, que vedam à mulher o acesso aos seus conhecimentos.
    A emancipação feminina deu-se com o direito de voto feminino começando a surgir em vários países.O século XX abriu realmente o grande  momento das  mulheres. No Brasil, o direito de voto aconteceu em 1932 e neste mesmo século as mulheres haviam conquistado também o direito de disputar olimpíadas .Nele, tivemos na América  a primeira mulher presidente, Isabel Peron .Depois, neste  século atual, tivemos presidentas no Chile e na Argentina . Ao final do ano de 2010, tivemos no Brasil a primeira mulher a dirigir o pais desde o tempo do império. No passado século XX ainda  deu-se também entre nós  a criação da primeira delegacia de atendimento à mulher. E, por fim , em 1979 quando,o premio Nóbel da Paz é ganho por uma mulher ,madre Teresa de Calcutá,  a Igreja, que na Antiguidade dera à mulher, num conclave, o reconhecimento de ter uma alma por apenas um voto,agora enalteceu finalmente a mulher na figura de madre Tereza ,a grande protetora dos pobres da Índia. Cientistas, esportistas, escritoras e mulheres simplesmente carismáticas enriqueceram este período aberto no século XX.
Madre Teresa, Nobel da Paz.   

Hoje lutamos ainda por abolir as mutilações sexuais autorizadas por leis em alguns países como naqueles  africanos aonde persiste ainda a famigerada infibulação do clitóris. Porém, pouco a pouco a mulher vai  conquistando novamente o seu lugar na História
   Quanto aquilo que o analista Yung chamou de Ânima, referência a parte da psique feminina, é a própria África que nos trouxe algumas características desta Ânima. Ao entrar no Brasil, os afros nos trouxeram uma religião matriarcal onde apenas as mulheres tinham acesso à iniciação.( hoje algumas linhas desta religião perderam esta característica)
    Seria bastante importante para nós mulheres ,desenvolvermos os atributos das grandes deusas de seu panteão.Nanã, Yemanjá, Yansã,Oxun.
    Nanã, a mais velha dos orixás, nos remonta à matéria primordial. É a mulher com características de anciã ,é sábia,conselheira,controlada. Nas desavenças familiares  e desarmonias grupais só a retidão de Nanã purifica. Sua dança emita o embalar de uma criança. Nanã  embala em seu seio a família. Já  Yemanjá é o mar , o instinto materno,o desejo de procriar .Iansã é a mulher sedução sensual , a sua extrema sensualidade faz vir à tona o instinto dos homens com a fúria das tempestades. É por isso chamada de” orixá das tempestades”.Esta força é porém amenizada na mulher pela energia doce de Oxum ,o orixá da pureza.Ela é a esposa fiel de Xangô.  É o dengue, a faceirice natural e espontânea,  a sedução da inocência. Yansã e Oxum são as duas forças sedutoras da sensualidade e da inocência a se oporem dentro da mulher. 

Oxum, senhora das águas doces.

    São nos mitos antigos que encontramos as principais características da Ânima . Quando Prometeu terminou de fazer a imagem do primeiro homem, amassando o barro da terra com suas
lágrimas, o que fez do homem apenas corpo e emoção, achou que sua obra estava incompleta. Resolveu então ir ao Olimpo pedir aos deuses que criassem uma companheira que o complementasse com características divinas.Então, no céu do Olimpo  os deuses  deram atributos imortais à primeira mulher que criou .Venus lhe deu uma beleza sedutora com que faria o homem aceita-la  ,Mercúrio lhe deu a sutileza, o poder de persuadir, força que será muito forte na 
mulher. Que homem -pensou Mercúrio- resistiria as sutis persuasões de uma mulher? Hera  contribuiu lhe dando o rigor ético com que manteria o homem preso ao lar.Porém Minerva, deusa da sabedoria, lhe deu a principal característica de sua Ânima: A curiosidade.É verdade que tanto na alegoria bíblica de Eva onde ela fez o homem perder o paraíso, como na alegoria de Pândora, a curiosidade é vista como uma força negativa na mulher.Porém, tanto na alegoria do jardim do Eden como na da caixa de Pândora ,onde esta, ao destampá-la por curiosidade, deixou escapar os bens do mundo, a curiosidade será sempre vista negativamente.

   No entanto, os gregos nunca deram à Pândora o rótulo de pecadora como o Cristianismo deu à  Eva.Os gregos respeitavam tal dom como lhe sendo dado pela  sábia Minerva e que pela curiosidade seríamos, nós mulheres, levadas à pesquisas e perguntas existenciais com a qual atingiríamos a sabedoria.
    Será porém nas doutrinas da antiga Caldéia, divergente da doutrina oficial do Judaismo ,que encontraremos uma das maiores forças femininas: O rigor .No gráfico de sua Árvore da Vida , aparece ali como nossa primordial genitora, Mãe Biná ,equilibrando a potência masculina quando esta se torna licenciosa ou excessivamente paternalista.A força feminina do rigor seria então a grande  mantenedora das estruturas sociais. O primeiro sinal da decadência de uma cultura seria o enfraquecimento da ética feminina. Se a mulher decai, a sociedade decairá. Por outro lado, as sociedades onde a mulher deixou que um sistema patriarcal enfraquecesse a força feminina, terá sempre como resultante a sua dissolução , como vem acontecendo a várias delas. Porém, tal como profetizavam os antigos Caldeus, a grande mãe Biná faria  uma reação a tal comando. A mulher então iniciaria uma avalanche de revoltas e só quando conseguisse de novo se impor, uma nova sociedade mais fraterna surgiria.
 Iansã, senhora dos ventos e das tempestades.

   Existe uma outra faceta em nossa Ânima que exige de nós mulheres uma maior reflexão.  Encontramos em nós forças de perdão, de condescendência ante os erros de um homem, no entanto, somos intransigentes e rancorosas quando erros provêm de uma mulher. Somos defensoras e amigas fieis de um homem, dificilmente de outra mulher. Os gregos ilustraram isto muito bem  no mito de Hera . Sempre que Zeus dava suas escapadas amorosas traindo-a, Hera acabava sempre por perdoá-lo, porém castigava com crueldade aquela que fora objeto da atração de Zeus. Fosse porque sentimento fosse, ou de concorrência pela beleza da outra ou porque num sistema patriarcal aceitasse o direito do homem de errar e não o da mulher, Hera, conhecida como rigorosa, exigia sempre um comportamento ético irrepreensível na mulher mas jamais no homem.
    Hoje, ainda observamos isto nos países islâmicos. Ali,  onde a liberdade da mulher é muito cerceada, a grande barreira à reabilitação feminina são as próprias mulheres. Contam-nos as escritoras que deixaram as sociedades islâmicas, que mães, irmãs, sogras continuam a exigir das mulheres mais jovens atitudes retrógradas. São elas as verdadeiras mantenedoras de costumes antigos que ajudam as leis feitas pelos homens a prenderem as mulheres às velhas tradições. 
   Continuam intransigentes dentro dos lares estimulando os meninos da nova geração na desvalorização feminina.
    Reflexionarmos sobre este nosso comportamento, fazermos um equilíbrio entre a mulher senhora do lar, a mulher mãe, a mulher sedutora, tão bem expostos nos mitos afros. Tentarmos equilibrar a misericórdia com o rigor, como já nos pediam os antigos caldeus,sermos a mulher curiosa que busca através de estudos a sabedoria, abriria para nós todos os ramos do conhecimento humano. Chegaríamos enfim aquilo que Prometeu e os deuses do Olimpo sonharam para nós: Sermos o complemento perfeito para os nossos queridos companheiros de evolução: Os homens.

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