sexta-feira, 8 de julho de 2022

Curiosidades no Caminho de Santiago de Compostela

 

Catedral de Santiago, o destino da peregrinação mística.

   
 Nesta rota que percorre perto de 900 km pelos locais mais verdes da Espanha, pegando o sol durante o dia sempre pela frente até chegar ao Finisterra, sobressaem-se lendas, ritos, arte arquitetônica história e poesia.

    A mais importante lenda do Caminho é aquela que gerou o seu próprio símbolo: A concha. Era já um grande símbolo no tempo do Paganismo, naquele em que o culto as deusas era intenso.

   A carne da concha (as Conquilles de São Jaques, iguaria tão apreciada na França), eram secas e servidas como filtro do amor, uma dádiva da deusa Vênus Afrodite nascida numa concha do mar. A Igreja, na época, lutou muito contra esta união do santo (Tiago) com a deusa, mas acabou cedendo a um culto que dura até hoje.

   As pessoas que cometiam delitos na Europa podiam fazer uma peregrinação à Compostela e assim seriam perdoados. Porém, ao retornarem tinham que trazer um comprovante de que chegaram lá. Traziam então conchas. Assim, tornou-se elas o símbolo do Caminho e a origem da Compostelana.

   O primeiro grande Rito do caminho é feito no Alto da Abaneta, em Rocenvalles. É o chamado “ritual das cruzes“. Geralmente, os peregrinos levam consigo pequeninas cruzes que ali deixam enterradas num simbolismo de que largam para trás suas mágoas e tristezas antigas, antes de começarem a caminhada. Chegar, enfim, de coração leve.

   Outro Rito, este bem emocionante, acontece na Cruz de Ferro. Ali era um antigo local de um rito pagão feito ao deus Mercúrio. Porém, os peregrinos cristãos durante séculos, levaram pequeninas pedras e virados de costas as atiravam dali. Hoje temos um monte de pedrinhas circundando a cruz.

    O conjunto delas representa uma nova humanidade tendo então cada peregrino contribuído com isso. Esta tradição provêm de uma lenda grega que assim nos conta:

   Quando o dilúvio assolou a terra, sobrou um casal grego: Decalião e Pirra. Perguntaram então ao oráculo do templo de Delfos, que ficara intato: Como viveremos agora nesta terra devastada? O oráculo respondeu: Pegue os ossos de sua mãe e atirem de costas.  Compreenderam eles então que a única mãe que agora tinham era a Mãe Terra e que as pedras eram os seus ossos. Dando as costas, foram atirando para trás muitas pedras. A umidade do dilúvio pôs sobre elas um limo que transformou-se em carne. O deus Apolo enviou um raio de luz que transformou-se na luz do espírito. Quando Decalião e Pirra se voltaram, viram surpresos uma quantidade de homens surgindo. Aparecia assim então a civilização Helênica.

O caminhante de Santiago.

   Outro Rito do Caminho é feito no Monte do Gozo, onde o peregrino, com prazer, já avista a cidade de Compostela. Faz ali uma ablução para chegar à sua catedral purificado.

   O último Rito será feito no Pórtico da Glória (entrada da catedral) onde o peregrino porá as mãos no pórtico e sente o lugar que possui a maior força telúrica do mundo.

   No setor da arte arquitetônica, não podemos deixar de citar o Gótico tão bem representado nas catedrais de Burgos e Léon.  Na de Burgos encanta-nos a porta do Sarmental, com sua belíssima escultura do Cristo instrutor cercado pelos quatro evangelistas e dos quatro animais do Apocalipse (touro, leão, águia e homem) simbolizando persistência, coragem, liberdade e consciência. Este tímpano é considerado como um dos mais perfeitos da arquitetura gótica.

   A catedral de Léon é a grande explosão de luz da arquitetura gótica com seus vitrais coloridos, suas 125 janelas de vitrais que nos dizem: “O homem medieval não é mais aquele humilhado, sombrio, do período Românico”. Deus é no novo homem luz, procura do alto, abertura.

   Importantes são, sem dúvida, as construções, geralmente de um teor místico, aquelas feitas pelos Templários. (já expulsos da França pela Igreja, enriqueceram de arte o percurso com capelas, ermidas, castelos, com hospitais de atendimento aos peregrinos. Em suas construções, deixaram o simbolismo místico com o qual desejavam encobrir da Inquisição os seus conhecimentos esotéricos).

   Uma das mais interessantes delas é a ermida de Eunates. Já seu nome fala sobre seu significado: “Eu Nato”, bem nascidos, renascidos, em latim. Tem a forma octogonal, sendo que o número 8 é o número da ressurreição. (lembremos que algumas igrejas na Europa tem a sua pia batismal em forma octogonal, fazendo referência aos bebês que ali renascem pelo batismo). Esta construção teve a influência octogonal da mesquita da Roca de Jerusalém, construída pelos Sufis no local do templo de Salomão.

  Está numa região repleta de tradições. Acredita-se que em seu subsolo passa uma corrente telúrica que vinda da França, cruza os Pirineus e a ermida de Eunates. Estas correntes energéticas da terra correspondiam a lugares de antigos cultos às divindades femininas, principalmente à Mãe Terra e as Virgens Negras da cor do telúrio.

Ao norte da ermida de Eunates, localizou-se o processo famoso das bruxas de Zagarramurdi, onde um quarto de mulheres da sua população foi queimada pala Inquisição.

O mapa do caminho.

   O Caminho é rico em história antiga medieval e moderna. Como história antiga lembremos-nos do Cristianismo primitivo, quando Tiago ,o grande apóstolo do Cristo, foi mandado a pregar suas mensagens na Espanha e o fez justamente em todo o percurso do Caminho. De volta à Jerusalém e sendo decapitado por Herodes, teve seu corpo enviado por seus seguidores de volta à Espanha.  Foi, porém, só na Idade Média, que seu corpo sendo achado, as peregrinações tiveram início.

   O nome Compostela vem de “Campo de estrelas” referido à chuva de estrelas vista sobre seu túmulo, o que o identificou.

   Quanto à história moderna do Caminho, além das grandes peregrinações feitas até hoje, temos o caso da capital de Astorga chamada de Maragataria. Ali vive um povo, os maragatos, que no século XVIII veio para o Uruguai e a Argentina e no século IX lutou na nossa revolução federalista como os Maragatos lutando contra os Chimangos. Segundo os historiadores, foram os Maragatos que trouxeram os costumes gaúchos para a nossa fronteira. Segundo se nota em sua região, os Maragatos espanhóis se vestem absolutamente iguais  à nossa indumentária gaúcha: Botas,  lenços no pescoço e na cintura, bombachas ,ponchos etc. Também são iguais quanto à alimentação, quanto ao jeito de preparar a carne para o churrasco.

   Ninguém melhor que um poeta para descrever os sentimentos de um peregrino do Caminho de Santiago. Assim temos:

                     Peregrinações 

“Polvo, barro, sol, lluvia

Es el caminho de Santiago

Milhares de peregrinos

I más de um milhar de años

 

Peregrino, quien te llama?

Que fuerza oculta te atrai?

Ni el caminho de las estrelas

Ni las grandes catedrales

 

No és la bravura  navarra

Ni  el vino de los Riojanos

Ni los mariscos galegos

Ni los campos castelhanos

 

Ni és la história e la cultura

Ni el gallo de la calzada

Ni el palácio de Gaudi

Ni el castelo ponferrada

 

Todo lo veo al passar

I és um gozo ver-lo todo

Mas la voz que a mi me llama

Lo siento mucho mas hond.

 

La fuerza que a mi empuja

La fuersa que a mi me atrai

No se explicaria  ni yo

Solo ele de arriba lo sabe

 

(Eugenio Gambay)