Dinar foi um dos primeiros mestres sábios dos dervixes. E, numa história, ele conta como atingiu aquela sabedoria e tornou-se um sufi prestigiado. Sua história ilustra também como às vezes o conhecimento que nos pode dar o mestre está ao nosso lado e nós não percebemos. Como o conhecimento depende de nos dedicarmos as coisas que estão ao nosso alcance, bem as nossas mãos. O que lhe aconteceu foi isto: Um dia Dinar entendeu que havia chegado o momento dele ir à busca do seu mestre e do conhecimento oculto, da sabedoria essencial.
A Mesquita de Malik Dinar é uma das mesquitas mais antigas da Índia, situada em Thalagara, na cidade de Kasaragof, no estado de Kerala. |
Logo que ele saiu de casa para iniciar a sua busca, encontrou um velho dervixe que começou a caminhar a seu lado silencioso por um tempo, mas depois lhe perguntou:
- Quem és tu? E para onde vais?
- Sou Dinar e inicio uma busca para encontrar o meu mestre e atingir a sabedoria.
- Eu sou Fatih e caminharei contigo.
- Podes, dervixe, me ajudar a encontrar o meu mestre e a sabedoria?
- Bem - respondeu o dervixe - o saber oculto está dentro de ti e encontrá-lo depende de como vais enfrentar as experiências que encontras pelos caminhos da vida. E qualquer companheiro de caminhada como eu ou qualquer mestre só pode transmitir o saber através de indicações, nunca vai entregá-lo totalmente, só parcialmente.
Depois de caminharem um pouco, encontraram uma árvore que balançava muito apesar de não ter vento, e rangia. O dervixe parou e disse: Esta árvore está nos dizendo alguma coisa, nos fazendo alguma queixa. Já sei, ela diz: Algo está me machucando, façam, por favor, uma pausa em sua caminhada e me ajudem!
- Estou com muita pressa – respondeu Dinar – tenho que encontrar o meu mestre. E de qualquer modo é um absurdo uma árvore falar.
Seguiram os dois o caminho. Depois de uns quilômetros o dervixe comentou: Quando cheguei perto daquela árvore eu senti um cheiro forte de mel. Talvez uma colmeia de abelhas tenha sido construída dentro daquela árvore.
Então- disse Dinar - devemos voltar, pois se encontrarmos mel poderemos comê-lo e até vendê-lo.
Voltaram. Porém, ao chegarem lá encontraram uma porção de homens felizes ao lado de inúmeros toneis de mel. Chegaram tarde, não havia mais mel para eles. Dinar ficou desapontado, mas seguiram seu caminho.
Chegaram depois ao sopé de uma montanha e ouviram um forte zumbido. O dervixe colocou o ouvido no solo e disse: Debaixo de nós milhares de formigas estão construindo uma colônia para elas. Este zumbido é um pedido de ajuda coletivo. Elas estão dizendo; Ajudem-nos! Estamos cavando para fazer um refúgio para nós, mas umas pedras estão barrando o nosso caminho. Cavem por favor! Ajudem-nos a removê-las!
O dervixe perguntou a Dinar – Devemos parar e ajudá-las ou queres ir adiante?
- Ora, dervixe, formigas e seus problemas não são de nossa conta. Eu, por mim, o que quero mesmo é seguir, encontrar o meu mestre e beber de sua sabedoria.
- Mas – argumentou o dervixe – dizem que todas as coisas do universo estão conectadas, será que também estas formigas não podem ter alguma conexão conosco?
Dinar não deu a menor importância às palavras do dervixe e só disse: Vamos, Vamos adiante! Fizeram uma pausa para dormirem e pela manhã Dinar viu que havia esquecido sua faca perto da montanha junto ao formigueiro. Vamos voltar lá - disse - para buscá-la. Ao chegarem lá, viram um grupo de homens ao lado de uma pilha de moedas de ouro. Essas moedas agora são nossas - disseram - à noite estávamos aqui, mas apareceu um velho dervixe que nos disse: Cavem ai. Uns acharão que isto são pedras, mas outros acharão nelas um tesouro. E engraçado, este dervixe que o acompanha é curiosamente parecido com o que nos indicou o tesouro.
- Ora – disse o dervixe – todos os dervixes se parecem.
Dinar lamentou sua pouca sorte e queixou-se: Que azar! Hoje poderíamos estar ricos!
Prosseguiram viagem e depois chegaram às margens de um rio e pararam para esperar o barqueiro que os transportaria à outra margem. Enquanto estavam ali sentados, viram um peixe que subiu à superfície da água várias vezes, abrindo e fechando a boca em direção a eles.
Este peixe - disse o dervixe - está querendo nos dizer algo. Ele diz; Engoli uma pedra. Peguem-me e me dêem uma erva ai da margem para eu comer Quando eu a comer vomitarei, e a pedra será vomitada junto. Por favor, tenham compaixão! Tenham piedade de mim!
Neste momento, a balsa chegava e Dinar impaciente para encontrar seu mestre e o saber oculto empurrou o dervixe para dentro do barco dizendo: Deixe o peixe pra lá, deixe!
Após pernoitarem na outra margem, pela manhã viram de novo o barqueiro que estava radiante. Dizia; hoje é o dia mais afortunado de minha vida! Vi um peixe de boca aberta que tentava com muito esforço pegar uma erva que estava na margem do rio. Eu então a coloquei em sua boca. O peixe vomitou uma pedra e voltou feliz para a água. Imaginem que a pedra era um enorme diamante! Estou riquíssimo – gritava.
Dinar voltou-se enfurecido para o dervixe, dizendo: Tu és um demônio! Sabias de todos estes tesouros, do mel, das moedas de ouro, do diamante por meio de um saber oculto que possuis, mas nada me dissestes. Quando acabou de dizer estas palavras, um clarão de luz se fez em sua mente: O velho dervixe era o seu mestre que tanto procurava! Sempre estivera ao seu lado, ao seu alcance, desde que iniciara a sua busca. Não o reconhecera mesmo quando ele tentara aumentar a sua sensibilidade, a percepção sobre cada coisa que vinha a seu encontro. Lembrou — se dos homens que lhe disseram que o dervixe que lhes mostrou um tesouro parecia-se com este. De fato, todos os mestres se parecem. Todos orientam discípulos que percebem ou não percebem as indicações que eles lhes dão para atingir os tesouros da sabedoria.
Deste dia em diante Dinar tornou-se ele próprio um grande dervixe, e depois um dos maiores mestres do Sufismo.
Extraído do livro “Historias dos dervixes” de Idries Shah.
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