Que
eu seja mais uma voz a louvá-las por sua graça, coragem e talentos.
Entre as mulheres nascidas no Sec. XIX são
minhas prediletas na História nacional: Maria Quitéria, Ana Neri, Besanzoni
Lage, Guiomar Novaes, Anita Garibaldi e Chiquinha Gonzaga. Todas elas, sem
exceções, lutaram contra o rigor de comportamento e atuação exigido às mulheres
do seu século.
A tendência guerreira, pela energia que irá
exigir, é geralmente atribuída aos homens, mas Maria Quitéria mostrou que é
possível sim a uma mulher a ter em grande proporção.
Nasceu
em Feira de Santana, na Bahia e foi a primeira mulher a ingressar numa unidade
das forças Armadas do Brasil, a primeira a entrar em combate e o fez pela nossa
Independência.
Filha de um lavrador, nem escola
frequentou. Porém, sabia como ninguém, montar, caçar e manejar armas.
Quando surgiram os primeiros movimentos
pela Independência e então foram procurados voluntários para servirem nas
tropas, Maria Quitéria quis alistar-se, mas seu pai, seguindo as ideias anti
femininas da época, não o permitiu. Ela então se vestiu de homem, cortou seu
cabelo e, às escondidas, alistou-se entre os “Voluntários do Príncipe Dom Pedro”.
Ficou ali conhecida como “o soldado Medeiros”
como desejou que assim a chamassem e nenhum entre os da tropa sabia que tal
soldado era na realidade uma mulher.
Quando seu pai, após procura-la, descobriu a
farsa, Maria Quitéria já então era muito valorizada pela habilidade em lidar
com armas de fogo e o comandante do Batalhão (então conhecido como “Dos
Periquitos” devido ao seu uniforme de punho e gola verdes) não permitiu que seu
pai a levasse embora.
Participou dai por diante em várias batalhas
e onde havia um foco de reação dos portugueses lá estava o soldado Medeiros.
Quando a tropa entrou em Salvador, recebeu ali homenagens devido à sua grande
coragem e audácia. Com o passar dos anos, Maria Quitéria foi reconhecida pelos
companheiros (grande proeza ser respeitada num tempo em que a mulher que
deixasse o lar nada valia) e não necessitou mais vestir-se de homem.
Esta mulher quase analfabeta, mas com
grande habilidade militar, recebeu das mãos do próprio imperador Pedro I uma
rara homenagem: A condecoração de “Cavaleiro da Ordem Imperial do Cruzeiro”.
No entanto, esta, que foi a primeira mulher
a integrar no Brasil num batalhão militar, morreu aos 61 anos em total anonimato,
como era de se prever numa época em que a desvalorização da mulher, mormente
neste terreno era nula. Porém, em 1953 ,nosso governo ordenou que seu retrato estivesse presente em todas as nossas Unidades do Exército.
A enfermagem é, sem dúvida onde mais se
demonstra a capacidade de doar-nos a alguém, a dedicação a desconhecidos apenas
pelo desejo de servir, de melhorar as condições de pessoas em sofrimento.
Nisso, Ana Neri, foi um exemplo. Considero-a
a manifestação do humanismo, da dedicação e do desprendimento de uma mulher.
Baiana, viúva aos 26 anos criou sozinha
seus três filhos, mas conseguiu tornar-se a pioneira de nossa enfermagem.
Quando explodiu a Guerra do Paraguai, e seus
filhos, já mocinhos, foram convocados para servirem nela, Ana inscreveu-se para
acompanha-los. Passando
pelo Rio Grande do Sul, permaneceu ali tempos para aprender com as Irmãs de
Caridade de São Vicente de Paulo as noções fundamentais de cuidar doentes. Já depois, no Paraguai, seus serviços
começaram a sobressair-se como inestimáveis em meio à falta de higiene e
carência de materiais médicos com que contava um país pobre como era então o
Paraguai.
Chegou a criar ali uma enfermaria modelo
numa zona então ocupada pelo nosso Exército.
Seu carinho e dedicação aos combatentes atingidos era tal que já lhe
granjeou ali o nome de “Mãe dos brasileiros”. Trabalhou incansavelmente indo de
núcleos à núcleos hospitalares das melhores cidades do Paraguai, como Assunção
e Corrientes. Isto se deu quando estava em seus 50 anos.
Perdeu um de seus filhos na guerra e, com a
sua característica muito maternal, voltou ao Brasil trazendo consigo seis
crianças órfãs paraguaias. (Havia já algumas vezes se indisposto com nosso
Exército por ter atendido feridos e doentes não brasileiros).
Por sua precária situação financeira e seu
primoroso trabalho, recebeu de D. Pedro II a concessão de uma pensão vitalícia.
No filme brasileiro “Brava gente, a história
de Ana Neri “a tivemos revelada nas magníficas atuações de Marília Pera e Lima
Duarte”.
Hoje, comemoramos o dia 20 de maio (dia de
sua morte), como o Dia Nacional de Enfermagem, numa iniciativa de Getúlio
Vargas.
Podemos avaliar o pensamento humanista desta
mulher por esta frase que escreveu: “A arrogância, o autoritarismo e a
prepotência só estão presentes onde não existe genuinamente sabedoria e
humanismo”. O certo é que ambos foram características que nunca lhe faltaram.
A música clássica deu-me momentos de prazer
e beleza em minha juventude através de duas grandes musicistas: Besanzoni Lage
e Guiomar Novaes. Besanzoni, cantora de ópera, voz de contralto belíssima que
enchia de expectadores o teatro Municipal do Rio de Janeiro, então chamado de Teatro
Lírico. Nasceu na Itália, mas passou a maior parte de sua vida de 74 anos entre
nós, casada com o empresário Henrique Lage.
Ao
visitarmos no Rio o Parque Lage, atual Escola de Artes Visuais, é impossível não
nos lembramos desta mulher que ali viveu, e encantava o principal palco lírico
da cidade com a sua virtuosidade.
Também Guiomar Novaes cujas interpretações
perfeitas ao piano das obras de Chopin a fez prestigiada nos E, U. e Europa,
foi durante o século XX o modelo de pianista que eu, então estudante de piano ,
assim como muitas meninas de minha época , deveríamos ter sempre em mente.
Deveríamos ter como meta alcançar o mecanismo dos dedos de Guiomar, a suavidade
do seu tocar e o sentimento que colocava em suas performances.
Imaginemos
uma pacata dona de casa de apenas 18 anos, dedicada a afazeres domésticos, casada
com um sapateiro da pequena vila de Laguna num Estado ainda pobre do Séc.XIX:
Santa Catarina. Teremos então uma aproximada ideia da figura inesquecível de
Anita Garibaldi
Jamais suporíamos que uma tal mulher
deixaria o marasmo do seu lar, se apaixonaria por um homem que não o seu
marido, e correria mundo com ele. Muito menos que iria se engajar num ideal
político que abrangia conflitos europeus e sul americanos, o que a faria
merecedora do título: ”Heroína dos dois mundos” .
Conta-se que sua calamitosa vida iria se
iniciar quando o capitão Giuseppe Garibaldi, revolucionário italiano ,chegou à
cidade de Laguna na tentativa de formar a República Juliana , uma rebelião
contra o império do Brasil chamada depois Revolução Farroupilha.
Recentemente desembarcado de uma fragata
–segundo um relato dele próprio- foi através de uma luneta que a avistou e se
seduziu pelo seu rosto . Após muito procura-la, finalmente a encontraria
casualmente, quando era hóspede na casa de um morador local.
Não
houve da parte dela indecisões ou preconceitos, o que seria natural para uma
mulher de seu tempo. Quando Garibaldi saiu de Laguna, ela, aproveitando que o
marido estava ausente da cidade , fugiu com Garibaldi para jamais deixa-lo.
Logo se viu no ambiente de um navio de
guerra aprendendo a lidar com armas e canhões. Estava então como única mulher
em meio a guerrilheiros e marinheiros que só a respeitaram porque, afinal ,o
capitão Garibaldi não era para alguém querer enfrentar. Porém, logo passaram a
admirá-la
pela sua habilidade muito eficiente nas artes guerreiras e sua participação em
todos os combates.
Sua coragem foi demonstrada na Batalha dos
Curitibanos. Nela, Anita foi presa, sendo informada que Garibaldi havia
morrido. Fugiu então para procurar o seu corpo em meio à perseguições e, à
cavalo, embrenhou-se em matas . Tendo que no trajeto atravessar um rio,
atirou-se nele, nadando até à outra margem e após dias sem alimentar-se ,finalmente
encontrou Garibaldi vivo em Vacaria.
Quando a Independência do Uruguai se viu
ameaçada, seu presidente convocou Garibaldi para comandar o seu exército e o
casal mudou-se ao Uruguai. Lá se casaram quando souberam da morte do marido de
Anita. Esta estava então em seus 21
anos. Tiveram cinco filhos.
Impossível avaliar-se o sacrifício de dar à
luz e criar bebês em meio à idas e vindas e aos tumultos de batalhas.
Garibaldi chamado depois à lutar pela
unificação italiana , foram os dois para a Itália. Ali, Anita ficou grávida de
seu quinto filho, mas sua saúde já estava bem debilitada. Chegaram a ver
proclamada a república em Roma mas a invasão austríaca obrigou-os a fugir dali.
Levada a uma fazenda nas proximidades de Ravena,
devido ao estado final de sua saúde ,ali veio a morrer junto ao bebê que
esperava, aos 27 anos. Infelizmente isso se deu sem a presença de Garibaldi que
estava sendo caçado pelo exército austríaco.
Mulher extraordinária ,Anita conseguiu
conciliar maternidade com uma propensão surpreendente pelas artes militares e
fidelidade à ideais.
Impossível se falar em talento musical sem
citar Chiquinha Gonzaga. Seu campo foi a música popular. Isto numa época em
que a mulher havia há pouco tempo recebido o direito ao voto , a temos
enfrentando ainda os preconceitos, que dificultavam suas aparições em público,
impedindo as artistas mulheres de participarem como os homens de um lugar
proeminente no cenário artístico. Mostrou sua precocidade quando aos 11
anos compôs sua primeira música.
Envolveu-se depois em todos os ritmos
populares: Lundus, fados serenatas , polcas, tangos, maxixes. Nada lhe escapava. Porém, foi no Chorinho que mais se
sobressaiu. Ritmo do qual foi ela a primeira a tocar a o piano.
Quase inacreditável é ter musicado perto de
77 peças de teatro. Porém, ao preparar peças para o Teatro de Revista visto por
muitos preconceituosos da época como um antro de licenciosidade, a sociedade não
a poupou com reprovações.
Casou-se aos 13 anos, mas deixou depois o
marido, apaixonada que estava por um homem que era um Play boy. Um escândalo de
muita repercussão pois o marido moveu-lhe uma ação judicial por abandono de lar
e adultério envolvendo até a Igreja.
Sofreu muito quando ele ficou com seus dois filhos menores.
Lembremos que um divórcio naquela época
requeria à mulher um comportamento como a de uma viúva triste e solitária. Mas
Chiquinha seguia imperturbável na sua surpreendente performance musical,
chegando a ser a primeira mulher a reger uma orquestra.
Escandalizou mais a sociedade quando, já
novamente separada do novo companheiro, foi á Lisboa, pois dali voltou com um
rapaz de apenas dezenove anos enquanto ela estava em seus 56.
No entanto, seu comportamento muito sensual
não a impediria de ser uma romântica. Mostrou isto na bela letra que escreveu para
a sua composição “Lua Branca” . Quem viveu no século XX, não se esquece da beleza
de seus versos: “O lua branca de fulgor e de encanto, se é verdade que ao amor
tu dás abrigo, O’ vem tirar do pranto meu o pranto, Ai vem matar esta paixão
que vem comigo!
Sua mentalidade que ia surpreendentemente
além do seu tempo, não se restringia apenas à música, abrangia também à
política. Muito trabalhou pela Proclamação da República e também pela Abolição
da Escravatura.
Ia, com a sua audácia ,de porta em porta,
vendendo partituras de suas músicas, conseguindo fundos para a causa
abolicionista. Sujeitava-se à hostilidade com que algumas donas de casa a
recebiam, mas pela alegria musical com que contemplava os moradores do Rio de
janeiro, conseguia sempre um bom montante de donativos.
O povo carioca ,sempre amante do carnaval,
empolgou-se quando compôs a música “O Abre Alas”, um sucesso imenso do carnaval
de 1899. Os Cariocas a homenagearam com uma estátua no seu Passeio Público.
Quando lembramos Chiquinha Gonzaga, sem
esquecer suas atuações como concertista e compositora, a vemos sustentando
noites de boemia, tocando um Chorinho após outro, para o deleite de seus
ouvintes. O piano sendo naturalmente numa época que estendeu-se até meados do
século vinte , o instrumento predileto dos artistas.
Em 2012, 165 anos após seu nascimento sancionou-se
a lei do Dia Nacional da Música Popular Brasileira, como o 17 de outubro, dia
do seu aniversário. Uma homenagem póstuma merecida para uma mulher que compôs
uma obra de quase duas mil composições.
Meu desejo de estar sempre sentada a ler ou
escrever dificultou meu corpo de voltar-se para o Esporte. Por isso mesmo
talvez tenha tanta admiração pela facilidade com que pessoas praticam jogos
esportivos. Assim, vejo o Esporte nos brindando com
duas mulheres luminares: Maria Lenk e Maria Ester Bueno .
Em
1925 o rio Tietê, em São Paulo, era muito limpo, propiciando nados de
recreação. Maria Lenk, pobre, sem piscina onde treinar ,foi ali que iniciou sua
esplêndida carreira de nadadora. Com apenas 21 anos sobressaiu-se tanto, que foi
contratada por clubes e escolhida a participar da Olimpíada de Berlim. Dali a
mais três anos, já batia recordes mundiais em Nado de Peito. Seguindo sua
ascensão vertiginosa ,em 1940 torna-se a primeira sul americana a competir no
E.U. quebrando lá 12 recordes. Única nadadora de nosso país a concorrer depois
no famoso Swiming Hall Of Fame, na Flórida.
Tornou-se também a precursora do Nado Borboleta para mulheres.
Sua carreira foi longa. Trabalhou até
morrer aos 92 anos em Copacabana tendo dado ao seu clube, o Flamengo, inúmeras
medalhas.
Para
Maria Lenk não havia idade que a cerceasse. Dos 85 aos 90 anos , no campeonato
de Munique para idosos, voltou de lá com 5 medalhas de ouro. Continuava ,apesar
da idade avançada, treinando 1.500 metros por dia .
O Rio de janeiro tem razão de inclui-la
entre as mulheres que marcaram a sua cidade. Foi a fundadora no Rio da “Escola
Nacional de Educação Física”, onde hoje é a Universidade Federal do Rio de
janeiro.
Em 2007 ,com justiça ,o Parque Aquático dos
Jogos olímpicos recebeu ali o seu nome. Coroou sua bela carreira escrevendo ,
segundo sua própria experiência, o livro : ”Longevidade e Esporte”, onde fala
naturalmente da necessidade do exercício físico na vida de uma mulher.
Advertência que parece até dirigida a minha própria inatividade física.
Já Maria Ester Bueno, sem dúvida a maior
tenista das Américas no Sec. XX, conquistou mais de 500 títulos em sua
carreira. Seu nome está hoje incluído no Livro dos Recordes, pois durante vinte
anos foi a nossa imbatível tenista . Porém, conquistou vários títulos na
Austrália, em Roland Garros, Wimbledon, sendo que nestas quadras foi sete vezes
campeã, sendo homenageada até hoje em todos os seus “Abertos” , na Inglaterra.
No Grand Slam que numa temporada de tênis é
o grupo prioritário, venceu numa incrível façanha 19 torneios. Entre os anos de
1959 e 1966 conservou-se a primeira tenista do mundo. A beleza de seus
movimentos era tanta, que lhe valeu o título de “bailarina do tênis“.
O jornal “O Globo” do Rio foi que mais a
glorificou, postando suas vitórias numa época em que os meios de comunicações
eram tão fracos que não nos legaram muitas fotos dos seus feitos. Após 1960, por
motivo de contusões e outros problemas de saúde , largou por alguns anos o
tênis, mas voltou depois para vencer o Open do Japão.
Tudo nos admira nesta mulher que já aos seis
anos jogava tênis e aos 15 anos já era a campeã brasileira ,e aos 39 já entrava
no “Hall da fama” na Flórida.
Hoje, Maria Ester Bueno, idosa, ainda
continua ativa para nossa alegria, como comentarista de tênis para canais de
televisão.
Ao se falar de música popular no Brasil
entre os anos 30 e 50 do Séc. XX, ninguém esquece a nossa “Pequena notável”:
Carmem Miranda. Era a personificação da brejeirice. Quase todos somos unânimes
em pensar que sua principal qualidade era a graça. Intérprete espetacular do
samba e de marchinhas, ficou caracterizada por suas vestimentas de baiana. Nelas,
nada lhe faltava: nem o turbante, nem o pano das costas, nem os inúmeros
colares e principalmente o grande tabuleiro que equilibrava na cabeça, levando
nele réplicas de frutas brasileiras, lançando também a moda das sandálias de
salto grosso e enfeitadas.
Nascera em Portugal mas veio para cá ainda
bebê e tomou o Brasil como sua pátria, fazendo aqui mais de 200 gravações. Sua
projeção internacional foi imensa , principalmente nos E.U. onde era conhecida
como “The Brazilian Bombshel” (A bomba brasileira). Chegou até a cantar e
dançar para o presidente Roosevelt na Casa Branca como “A embaixatriz do
samba”.
Desde que lançou sua primeira gravação: “Taí
eu fiz tudo pra você gostar de mim...” passou a ser muito amada pelo nosso público.
Porém inesquecível é sem dúvida os sambas “O que é que a baiana tem?” e “O Tico
Tico no Fubá”. Por sua popularidade, sua
figura era reproduzida em imagens de papel e serviu também em desenhos de
Disney. Inesquecível ficou o conjunto com o qual atuava: “O Bando Da Lua”.
Entre
as cantoras da rádio Tupi, foi a primeira a conseguir ali um contrato, mas
atuou muito também no Cassino da Urca, famoso então em sua época.
Morreu muito cedo aos 46 anos nos E.U. mas
o governo brasileiro requisitou seu corpo para enterra-la na presença de seus
inúmeros admiradores do Rio de janeiro.
Assistir
uma atuação teatral de Cacilda era fazer frente a um dos maiores talentos de
nossa Dramaturgia.
Nascida em 1921, iniciou sua carreira
teatral no teatro dos Estudantes aos 20 anos. Aos 25, trabalhava já ao lado de
Maria Della Costa na peça “Vestido de Noiva , de Nelson Rodrigues.
Quando ingressou em São Paulo no teatro
Brasileiro de Comédias , logo se tornou a sua primeira atriz. Em 1955 aos 34
anos ,casada então com o ator Walmor Chagas, fundou sua própria Companhia (que
leva até hoje o seu nome) junto a sua irmã Cleide Yaconis, que então se
iniciava no teatro. Lembro-me bem da
emoção que senti ao vê-la interpretar magistralmente a belíssima peça “Mary Stuart”,
ao lado daquela.
Imensamente versátil, interpretava
personagens absolutamente opostas: Um moleque, uma velha, uma devassa ,uma
rainha. Atuou com os mais renomados
atores nossos: Sergio Cardoso, Walmor Chagas, Zienbisnky. Chegou a encenar 68
peças em seus quase 30 anos de carreira.
Entre seus mais famosos trabalhos lembramos
sua magistral atuação em: “A Dama das Camélias”, “Quem tem medo de Virgínia
Woolf?, “Antígone”, “Vestido de Noiva“, “A Visita da Velha senhora”.
Morreu como desejaria: Encenando. Em pleno
palco teve um aneurisma fulminante com apenas 48 anos.
Muitos dramaturgos a consideram a melhor
atriz já aparecida em nosso teatro.
Teatro São Pedro em Porto Alegre. |
Falando em teatro, não posso esquecer-me que
tivemos entre nós, Riograndenses, uma das maiores protetoras das artes cênicas
de nosso país: Eva Sopher. O mês que se passou (fevereiro),devido a sua idade
avançada (94 anos), a perdemos. Toda a
Secretaria de Cultura do Rio Grande Sul e principalmente o povo de Porto Alegre
ficou em luto.
Foi
a defensora de todas as melhorias materiais e culturais do nosso Teatro São
Pedro. Trouxe ao nosso meio os mais renomados artistas teatrais. Liderou nele,
conferências, festivais e inúmeras peças teatrais.
Sempre nos lembraremos de sua figura solícita aguardando e
cumprimentando espectadores habituais, em noite de espetáculo, na entrada do
Teatro.
Recebemos dela exatamente 42 anos de intensa dedicação ao que de melhor
tivemos em matéria de cultura. Devemos enfim muito à esta magnífica mulher.
No campo da poesia, que mulher ,no meu ver, poderia se igualar
à Cecília Meireles?
Muito religiosa, dizia que devia a sua
sensibilidade a sua avó, tão espiritualista que a criara, quando na infância
perdeu seus pais. Esta tendência marcou muitos de seus trabalhos. Revela isto
ao afirmar : “A noção ou o sentimento de transitoriedade de tudo é o fundamento
de minha personalidade”. “Em “O Retrato”
entre outros poemas , nota-se esta grande influência.
Talvez a mais versátil de nossas poetisas, foi
também tradutora, folclorista ,jornalista, conferencista.
Aos 14 anos já escreveu sonetos com os
quais faria sua estreia na literatura reunindo-os num trabalho. Na Universidade
do Distrito Federal , então Rio de Janeiro, atuou como professora de literatura
luso-brasileira. Trabalhou também como jornalista no jornal “Diário de
notícias”
Foi muito ligada à Portugal onde fez varias
conferências em Lisboa e Coimbra.
Além da espiritualidade, que marcou de
intimismo sua obra , o Barroco, o Parnasianismo, o Simbolismo estão em seus
inúmeros poemas.
Sua obra inclui temas lendários
,históricos, religiosos e mitológicos.” O Romanceiro da Inconfidência” (sua
mais conhecida obra) está já vinculado ao nosso Modernismo (1953) . Seu tema versa
sobre a “Inconfidência Mineira”, e nada foi ali esquecido. Nem a febre do ouro,
nem personagens de inconfidentes e o seu principal: Tiradentes. Para uma
apaixonada por história ,este tema é naturalmente imperdível.
Fez
um linda coletânea de versos junto ao nosso grande Mario de Andrade.
Suas
viagens foram inúmeras, sempre recebendo nelas um grande reconhecimento: Do
Chile recebeu “A Ordem do Mérito” e em 1964 , ano de sua morte, foi inaugurada
em Valparaiso a Biblioteca Cecília Meireles.
Na Índia, a Universidade de Delhi lhe concedeu o título de “Doutora
Honoris Causa . Um ano após a sua morte, em 1965, recebeu do governo brasileiro
o prémio “Machado de Assis” pelo montante de seu trabalho.
Sem citar aqui muito mais de sua versátil
obra, pela exiguidade deste relato, consideramos Cecília Meireles ,sem dúvida,
a mais inspirada , lírica e talentosa de nossas poetisas.
Terreiro do Gantois, em Salvador. |
Entre
nossas notáveis religiosas lembremos duas: Menininha do Gantois e Irmã Dulce.
Serviram a setores diferentes: Menininha, na Afro Brasileira e Irmã Dulce, no
catolicismo cristão.
Menininha do Gantois liderou um dos
primeiros terreiros fundados na Bahia em 1849,nos primórdios do culto afro
entre nós. Seguia com maestria a tradição de sua bisavó, uma negra escrava, sacerdotisa
do período matriarcal do Candomblé baiano.
Desde criança já fora escolhida como futura
yalorixá por seus dotes de carisma e
sensibilidade. Juntando a isso sua grande habilidade administrativa, tornou-se logo a mais famosa entre as Mães de
Santo. Era muito generosa : Conhecedora
dos ritos de seus ancestrais africanos, dedicava-se a ensina-los a quem neles
se interessasse. Passava também com frequência seu “Axé”( energia espiritual)
para suas noviças.
Nos primeiros anos de seu mandato sofreu a
perseguição da Igreja, mas sua personalidade carismática atraiu para si a
simpatia de homens famosos como Caetano
Veloso, Vinícius de Morais, Jorge Amado e outros muitos , que foram todos grandes
“Ogans”, financiadores e propagadores de seu terreiro. Em troca ,recebiam seus
sábios aconselhamentos.
Em 1972 com 58 anos recebeu de Dorival
Caymi sua famosa música ”Oração à Mãe Menininha”. Em seus versos dizia: “A
beleza do mundo? Tá no Gantois .E a mãe da doçura ? Tá no Gantois. E o consolo
da gente? Tá no Gantois”. Emocionante é também se ouvir Gilberto Gil cantar seu
“Réquiem pra Mãe Menininha do Gantois”.
Tendo servido à Afro por mais de 60 anos,
foi sem dúvida a embaixatriz da cultura negra entre nós.
Irmã Dulce é para mim o exemplo mais
marcante da perfeita religiosa. Uniu devoção e disciplina aos postulados de sua
Igreja , com um desejo imenso de servir à humanidade. Nascida na Bahia em 1914, aos 20 anos se
tornou freira, quando então passou a dedicar-se exclusivamente à pobres e
necessitados.
Mesmo sempre muito debilitada ,pois sofria
de problemas respiratórios, jamais deixou de trabalhar por longos 50 anos.
Criou no Convento de Santo Antônio (hoje Hospital Santo Antônio) um albergue
para doentes aos quais se dedicava. Criou também o Colégio Santo Antônio para
família de operários.
Porém ,não foi só a Bahia favorecida por
sua personalidade amorosa. Trabalhou também muito em Sergipe na “Congregação
das irmãs Missionárias da Imaculada Conceição da Mãe de Deus”.
Em 1980 foi com 66 anos, durante uma visita
do papa João Paulo II convidada a subir ao palco a seu lado, quando então
recebeu dele o presente de um terço.
Foi beatificada pelo papa Bento XVI em 2010
pois lhe foi reconhecido um milagre.
Hoje o Vaticano estuda sua vida para a possibilidade de outro milagre, o
que a faria então ser canonizada.
Em 2000 numa homenagem póstuma recebeu do
papa João Paulo II o título de “A Serva da Deus”, porém aqui no Brasil
preferimos chama-la sempre de “O Anjo bom da Bahia”
O
que impressiona-me em Raquel de Queiroz é a fidelidade com que nos transmite um
tema regional, expõe cruamente sua vivência sem omitir as agruras da região
mais árida e árdua de nosso país : o Nordeste.
Escritora
de Fortaleza, de origem humilde, foi a primeira mulher a entrar na Academia
Brasileira de Letras, ganhadora de inúmeros prêmios, inclusive o importante
“Camões” de Portugal.
Escreveu seu primeiro romance “O Quinze”
aos 20 anos, já moradora no Rio de Janeiro. Este, relata uma grande seca vivida
pela autora quando tinha apenas 5 anos, conta-nos o drama dos retirantes do
nordeste. Esta é talvez a mais linda obra regionalista da nossa literatura.
Aos sete anos, seus pais fugiram aos
horrores da seca, indo para o Rio de Janeiro .Porém, apesar da precariedade de
seu primeiro lar, Raquel sempre amou a intelectualidade, descendente que era do
grande escritor autor do “Guarani”, José de Alencar.
Seu livro “Memorial de Maria Moura”
tornou-se outro de seus importantes sucessos.
Foi aproveitado pela TV numa minissérie de imensa aceitação pública.
Atuou também como dramaturga escrevendo
peças para o teatro como “A Beata Maria do Egito” e “Lampião”. Por todo o
montante de sua obra mereceu ser a primeira mulher delegada na Assembleia da
ONU.
Morreu aos 93 anos após uma carreira onde
durante 70 anos foi uma escritora brilhante.
Em se
tratando de nossas mulheres na política, teríamos de regredir há muitos anos
atrás, ao tempo do nosso império.
Buscaremos esta mulher: Carolina, Josefa
,Leopoldina, Francesca, Fernanda de Habsburgo . Nome de rainha? Sim. Mas, a
conhecemos simplesmente por” Imperatriz Leopoldina”. Na verdade, nem a poderia
incluir neste relato pois não era brasileira e sim austríaca. Porém, veio para
cá muito jovem para se casar com o nosso imperador Pedro I e dedicou desde
então todos os pensamentos de sua vida ao nosso país como se brasileira fosse.
Se é certo dizer-se que “por traz de todo
grande homem se esconde uma grande mulher”, ela poderá bem ser um exemplo.
Justifica-se isto no título que lhe atribuem: “A Paladina da Independência”
Casada em 1817, foi a sombra influente por
traz de D. Pedro, no processo da mais importante reivindicação política que
tivemos: A Independência .
Buscou também intensamente a aceitação da
nossa Nacionalidade por Portugal, sendo ela a mentora da carta escrita por D.
Pedro a D. João VI, onde aquele consegue a nossa separação oficial de Portugal,
ocorrida uns dias após a Independência em 22 de Setembro de 1822.
Todos os nossos historiadores a consideram
a figura chave por traz da política de sua época. Foi também a imperatriz mais
amada por nosso povo, incluindo nele os escravos que a adoravam pelos
sentimentos de tristeza que expressava em respeito aos sofrimentos dos negros.
Todas as classes sociais a amavam.
Sua vida matrimonial não foi das mais
tranquilas, pois D. Pedro I ,um namorador contumaz ,tinha também já desde antes
de casar-se a sua amante predileta: Domitila de Castro, a quem dera o título de
“Marquesa de Santos”. Muita humilhação sofreu por esta relação de D. Pedro, mas
sempre portou-se com a dignidade de uma verdadeira imperatriz.
Morreu de parto no Paço de São Cristóvão no
Rio ,com apenas 29 anos já tendo dado ao marido sete filhos .Quando faleceu, D.
Pedro tinha se ausentado por um trabalho no Sul e ela dias antes, talvez
prevendo o seu fim eminente ,com a sua peculiar amorosidade , o perdoou por
todas as humilhações que a fizera passar. Ficou no Rio como regente do império
em sua ausência. Muito doente e grávida de três meses ainda chegou a presidir
um Conselho de Ministros antes de falecer.
Sua morte foi uma perda irreparável para
todo o país. Muitas rezas e orações espontâneas populares a antecederam. Nunca
o país havia visto tantas manifestações por uma figura pública. Vê-se isto também
em escritos deixados pelos escravos ,onde era dito como um lamento:- “Quem
tomará o partido dos negros? Nossa mãe se foi”.
Quase dois séculos depois, em 2017, na T.V,
com a novela “Novo Mundo”, esta notável imperatriz teve ressaltada mais uma vez
a sua importância em nossa História.
Com exceção de nossa querida Maria Ester
Bueno, todas as mulheres aqui citadas estão falecidas. Hoje porém, temos
mulheres notáveis em plena atividade: Atrizes, bailarinas, cantoras, jogadoras,
jornalistas.
Temos Fernanda Montenegro , Ana Botafogo, Bibi Ferreira, Marta da Silva
(Marta), Marta Medeiros e muitas outras enchendo de beleza e talento o nosso
cenário nacional.
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