quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

O Dilúvio Grego

Muito conhecida é a história do dilúvio judaico, quando Noé aporta a sua arca no cume do monte Ararat. Porém, pouco divulgada é aquela do dilúvio grego. Vamos então lembrá-la:
   Quando Prometeu, o grande herói civilizador ensinou aos homens o uso do fogo, tal como previra o deus Zeus, os homens se acharam tão poderosos que esqueceram os deuses, a sua parte espiritual. Passaram a fazer desmandos mais desmandos e corromperam a humanidade.
   Então, os três irmãos olímpicos Zeus, Netuno e Plutão, irritados resolveram unir-se para criar um cataclismo que acabasse com aquela humanidade propiciando a vinda de outra melhor. Zeus, o senhor dos céus, fez despejar das nuvens chuvas torrenciais, Netuno enfiou o seu tridente no fundo dos mares fazendo as águas crescerem e os rios transbordarem e Plutão já preparou seu reino dos mortos para receber as almas que ali chegariam.
   O dilúvio veio. Porém, lá aos pés do monte Parnaso, morava um casal muito devoto e amante dos deuses: Decalião e Pirra. Prometeu o eterno protetor dos homens, então, os ensinou a fazer uma barca. Com ela, eles navegaram nove dias e noites dentro das águas revoltas e foram parar nos altos do monte Parnaso. Ali, desesperados, pediram um oráculo à deusa Geia para saberem o que fariam com aquela terra devastada. Entravam assim num sistema oracular, muito usado na Grécia antiga, onde o consulente fazia uma pergunta que era respondida não claramente, mas com uma proposição a ser decifrada.

Decalião e Pirra atirando pedras sobre
os ombros, dando origem a nova humanidade.

   Geia lhes disse: Sem olharem para trás, atirem os ossos de sua mãe para além dos seus ombros. Muito tempo levaram para interpretá-la, pois nenhum osso de qualquer mãe havia mais.  Acabaram, porém, por compreender que a única mãe que possuíam agora era a Mãe Terra e que seus ossos eram as suas pedras.
   Pegaram pedrinhas e as atiraram para trás das suas costas e logo o limo que fora deixado pelo dilúvio envolveu as pedras tornando-se carne e transformaram-se em homens. Quando o casal virou-se ali viram uma nova humanidade que surgia.
  Contudo, das profundezas da terra, levantou-se uma serpente ameaçadora. Mas logo, lá do alto céu, o deus solar Apolo, que havia reaparecido, a matou flechando-a com os seus quentes raios. Tal serpente é interpretada pelos mitólogos como todos os nossos instintos inferiores que querem nos dominar quando queremos melhorar evoluir, mas que acabam sempre vencidos pela nossa parte espiritual, nossa luz solar interna.
   Na verdade, após o dilúvio grego surge a maravilhosa civilização helenística. Decalião teve um filho de nome Heleno que dará nome de Hélade àquela terra reconstruída e nomeará de Helenos a seus habitantes.
   Assim, temos na Grécia antiga uma incomparável civilização que se espalhou numa vasta área desde o Mediterrâneo à Ásia. Desenvolveu-se no início do reinado de Alexandre o Grande pelo século IV A.C. Este difundiu aquela cultura rica em todos os tipos de Arte, em Filosofia, e Ciência Astronômica.
Esta cultura Helenística, segundo a Mitologia, é um resultante da intermediação punitiva dos deuses imortais através do Dilúvio Grego. No entanto, foi uma das civilizações mais espetaculares que o mundo já conheceu!

domingo, 4 de novembro de 2018

Mitos Brasileiros

O imaginário popular com seus mitos é riquíssimo em nosso país. Aqui estão alguns deles:

Mula Sem Cabeça - O cristão convicto, rigoroso e ingênuo não poupou os sacerdotes que traiam o seu voto de castidade. Porem, segundo o pensamento católico, a mulher será sempre a grande sedutora, maior pecadora. Tornaram então suas amásias em Mulas sem Cabeça. Também chamadas de ”Burrinha do Padre”, em certa altura da vida, elas os abandonam e numa noite de quinta feira perdem a beleza de seu rosto transformando-se neste animal decapitado.


   Sua sina é correrem troteando desabaladamente, sem rumo, perdidas pelos campos. Sem a intenção de agredirem alguém, dão, porém, fortes coices a tudo que lhes passar pela frente. Só voltam a serem mulheres, caso os seus amantes sacerdotes as amaldiçoarem diante do altar, antes de iniciarem as suas missas. Não são poupadas nem depois da morte, pois suas almas tornam-se assombrações cuja presença muitos latidos contínuos de cães anunciam.

Bicho Papão e Tutú – Mitos que assustavam imprimiram antecipadamente terríveis medos nas mentes infantis. As mães de cinquenta a cem décadas atrás, sem o preparo psicológico para a educação de seus filhos como as atuais, costumavam embalar para o sono os seus bebês amorosamente no colo e caminhando incansavelmente de um lado a outro. Porém, os amedrontavam com canções deste teor: “Bicho Papão lá de cima do telhado, pega esta criança que não quer dormir calada”. Depois então, ingênuas, pediam o afastamento de outro ser imaginário, igualmente terrível, cantando ainda: “Tutu Marambaia não venha mais cá, que o pai do menino te manda matar”.
   Talvez pensassem depois, que só a segurança de um pai protetor daria um perfeito descanso, livraria suas crianças dos seres imaginários nos quais acreditava.

O Anhangá - Nossos índios também não foram isentos (com certeza ainda não o sejam) do temor a estes tipos de seres fantasmagóricos.
    Muitas tribos opunham Anhangá, ser mau que era, à bondade de Tupã, para muitos o deus do Brasil.
    Os primeiros Jesuítas aqui chegados falaram muito deste temor que os índios tinham a esta espécie de Duende que trazia maus agouros para quem tivesse a infelicidade de vê-lo.


   Anhangá, ser espiritual, é fantasma maligno que se encarna com a aparência de um grande veado que ataca caçadores principalmente nas noites de sexta feira. Todos os males das tribos eram atribuídos a este maligno ser e muitos locais na mata eram evitados por estarem “mal assombrados”. Conta-nos Câmara Cascudo, em seu belíssimo livro sobre a geografia dos nossos mitos, que existe ainda a crença de que um recém casado deve evitar adentrar este lugares, pois se caso encontre Anhangá, morrerá.
   O mito de Anhangá me faz recordar uma canção escolar que crianças cantavam no dia do índio.
   Dizia ela: “Oh! manhã de sol! Anhangá fugiu! Ah! Ah! foi você! Que me fez sonhar e me lembrar da minha terra!”.
   Seguia-se depois um apelo à Tupã que assim dizia:
 “Oh! Tupã, deus do Brasil, que o céu enche de sol, de estrelas, de luar e de esperança. Oh! Tupã tirai de mim esta saudade! Anhangá me fez sonhar com a terra que eu perdi!”

As Bruxas - Sua crença está em todos os recantos de nosso país. Porém, em Florianópolis com seus muitos descendentes das ilhas portuguesas dos Açores, que de lá trouxeram esta lenda, ela é muito forte.
   Contamos hoje com os magníficos escritos de Franklin Cascais que nos conta “causos e mais causos” atribuídos a bruxas e relatados por gente humilde e contadora de histórias.
   Geralmente trata-se de idosas que foram a sétima filha de partos de mães que deram a luz sete filhas mulheres uma após outra. São vistas voando em bando, desenrolando os fios de um novelo que determinará pela maior metragem do fio desenrolado quem será a chefe do bando.
   Mas trabalham também individualmente em toda parte da ilha principalmente em Cacupé, na Lagoa e em Santo Antônio de Lisboa.


   O temor de alguns ingênuos habitantes afirmam que com suas bruxarias chupam o sangue de criancinhas e lhes provocam diarreias até deixa-las em pele e osso: infernizam a vida de pescadores quando estão a tarrafarem, equilibrando-se sobre o balanço das ondas transvestidas em formas assustadoras.
   Em dias passados os cavalos foram as suas maiores vítimas. Faziam elas tranças em seus rabos com nós tão apertados que deixavam os pobres animais sangrando e as vezes os faziam voar depois com elas sobre o rancho de seus donos, exibindo a estes descaradamente, em deboche, aquele malefício. Para os seus donos havia apenas o recurso de leva-los nas noites de Sexta feira Santa para banharem-se no mar para afastar deles possíveis bruxedos.
   Acreditam ingênuos ilhéus que suas façanhas são conduzidas pelo “Capeta”, pois, já quando algumas bruxas nascem já lhes coloca como sinal um dente canino no céu da boca e as fazem sempre acompanhar por morcegos que dão voos rasantes e por corujas.
   O antídoto mais usado contra bruxarias é sem dúvida o cheiro do alho, por isso ainda usa-se nos ranchos mais humildes pendurar-se réstias de alho nas paredes.
  Franklin Cascais, porém, distingue bruxas de feiticeiras. Essas últimas são as famosas e benquistas benzedeiras, muito requisitadas, que também afastam desavenças familiares e resultados de “mal olhado”. Ainda hoje são muito procuradas em Ribeirão da Ilha e Monte Ratone. Costumam benzer uma casa endemoninhada com a queima de cascas de alho. Também a água recolhida numa fonte antes que o sol se ponha na Sexta Feira da Paixão, também é acreditada como um recurso espiritual muito eficaz contra estes tipos de maldades.
   Assim é, na forte ingenuidade das crenças catarinenses, o grande medo causado por estas imaginárias bruxas.

O Lobisomem - Seu mito percorre todas as regiões de nosso país com poucas variações entre eles. Segundo a tradição, origina-se de uma doença milenar de nome Licantropia. Conta-nos Câmara Cascudo, o grande mitólogo, que a Licantropia nos leva até um rei da Grécia antiga chamado Licaon que tentou matar Zeus lhe acabando com a imortalidade. Este então o castigou transformando-o, pondo nele a maldição de um lobo voraz.  Já a visão católica moderna atribui a origem do mito a castigos contra relações sexuais incestuosas.
   O mito nos diz que depois de sete filhos machos, o último deles poderá tornar-se um Lobisomem. Não havendo, pois, nenhum indício de que isto acontece à mulheres.
   Como homem, ele apresenta uma aparência de cor amarelada e tem no rosto uma palidez cadavérica. Como personalidade é geralmente melancólico, dado a esquivar-se à convivências, retraído e apático. Apresenta as vezes os joelhos e cotovelos esfolados, pois quando transformado, corre sobre eles numa imitação de patas.
   Transformado, é uma espécie de vampiro cuja voracidade por sangue o faz dar dentadas nas carótidas de suas vítimas. Essas são geralmente animais novos como porquinhos, novilhos, cabritos e as vezes até crianças recém nascidas.
   Sua transformação dá-se habitualmente nos primeiros minutos de uma sesta feira. É então quando procura um lugar que lhe dê estrumes de animais nos quais irá se deitar, buscando ali energias animais. Então, tirará a roupa dando sete nós nelas. Acontecendo tudo isto em noites de lua cheia, quando então uiva como um lobo.
   Tal maldição lhe durará até as duas da madrugada, hora em que voltará ao lugar em que se transformou. Tirando os nós das roupas, veste-as retornando à aparência humana. Se alguém desejar fazer-lhe mal, buscará suas roupas e tirará delas os nós, pondo-o para sempre na condição de um lobo voraz por sangue.  Estas histórias são contadas e acreditadas do norte ao sul do Brasil.

 O Boitatá - Esse mito refere-se ao desconhecimento do que produz o Fogo Fátuo, aquela espécie de emanação que surge luminosa, fruto da decomposição de corpos animais. Era já muito temido pelos Tupis-Guaranis no Séc. XVI, logo após nosso descobrimento. É cultuado especialmente no Sul onde é conhecido como Cobra de Fogo.



   Sua aparência é vista como uma espécie de Jiboia que emite clarões. Vive geralmente nos pântanos e muito nos cemitérios, devido as decomposições naturais ali acontecidas.
   Se alguém avistar o Boitatá, o mito aconselha a permanecer parado, não provoca-lo com uma corrida, pois a velocidade desta cobra sempre o vencerá para comê-lo, melhor dizendo comer-lhe os olhos, parte visada sempre pelo Boitatá. Em geral, o Boitatá ataca as pessoas que desrespeitam as matas, entrando nelas para destruí-las. Olhar a Cobra de Fogo nos olhos - diz o mito - é sempre perigoso, pois pode cegar o incauto.

Alguns locais também receberam a crença de serem encantados. Provocam o temor de serem adentrados. Assim temos no Sul a Salamanca do Jarau e no Norte a Alamoa de Fernando de Noronha.

A Salamanca do Jarau - Trata-se de uma caverna, uma furna em Quarai no Rio Grande do Sul chamada de Cerro do Jarau. Esta caverna estaria cheia de tesouros e riquezas, mas guardada por um grande lagarto encantado.
   Seria ele em sua origem uma princesa moura que chegara aqui quando da expulsão dos mouros na Espanha. Trouxera com ela um tesouro que escondera na caverna. Aqui, porém, foi transformada pelo diabo indígena Anhangá num grande lagarto, com uma cabeça que emite fogo de uma pedra em sua cabeça. Então o lagarto passou a guardar a entrada da caverna cegando o incauto que o encontrar.

Cerro do Jarau, no município de Quaraí

    O mito nos conta ainda que um sacristão do tempo da catequese Jesuítica no Sul conseguiu domar o lagarto. Leva-o então para o seu quarto, aprisionado. Porém, quando já sonhava com as grandes riquezas da caverna das quais seria dono, subitamente o lagarto se transforma numa linda mulher, o que de fato era. Seduzido por sua beleza, acaba sucumbindo a seus encantos e vive com ela em grande paixão.
   Tendo sido, contudo, descoberto o seu deslize contra votos de castidade que havia feito, iria ser executado, mas justamente no momento em que seria morto aparece o lagarto e cega a todos os seus executores. Foram depois os dois se esconderem na caverna onde vivem sua paixão. Guardam até hoje as riquezas da Salamanca do Jarau, intocadas, pois todos que pretendem visita-la terão que enfrentar a potência cegante do lagarto encantado cujo nome é Teiniaghá.

A Alamoa – Desde 1737 a ilha de Fernando de Noronha se transformou num presídio. Assim permaneceu por mais de 200 anos. É então desde este longínquo tempo que o imaginário dos detentos, que podiam circular pelo espaço da ilha, criou a lenda da Alamoa.

Morro do Pico, em Fernando de Noronha.

   É ela uma linda mulher loura vista em dias de tempestades aparecendo na praia com longos cabelos que lhe chegavam até os joelhos ,deixando apenas entrever uma sedutora nudez e ali bailava, bailava para o encanto dos detentos. Recolhia-se depois à sua moradia situada no Morro do Pico, grande elevação de pedra que se avista desde longe, tornando mais majestosa a deslumbrante beleza da ilha.
   Escutavam então em sonhos uma voz feminina que de lá os chamava para vir a seu encontro no Pico, presumivelmente para ajuda-la a desenterrar um tesouro. Seduzidos pelo tesouro e por um possível relacionamento amoroso com tal mulher, os prisioneiros iam até o Pico e perto dali esperavam que a noite de sexta feira chegasse, ocasião em que o Pico misteriosamente abria na pedra uma fenda, uma porta de entrada.
   Lá chegados, o pavor, porém, os tomava, pois ao invés daquela linda mulher, encontravam uma caveira ambulante assustadora, que imediatamente fechava a fenda da rocha os prendendo ali. Ninguém via mais estes homens.
    Muito tempo ainda depois do presídio fechado, este mito levou pescadores e marinheiros a não se aproximarem do Pico temendo a presença da Alamoa caveira.

O Boto - Muitas crianças na Amazônia são chamadas de “Filhas do Boto”. Isso deve-se a este mito cultuado por gente muito humilde.
   Em locais de festas nas pequenas comunidades, costuma aparecer um rapaz muito bem vestido todo em terno branco, que encanta com o seu charme as moças solteiras locais.
  Na verdade, ele é fruto do encantamento de um Boto rosa que vive nos rios amazonenses e que repentinamente transforma-se naquele sedutor rapaz. Nas festas, ele, muito galanteador acaba por convencer alguma moça jovem para acompanha-lo num passeio idílico nas margens do rio. É ali que ele as estrupa e as engravida.
   Esse mito vem a séculos justificando a gravidez de muita moça engravidada pelo próprio namorado, que foge assim à fúria de pais rígidos, mas ingênuos.

O Saci Pererê - É um negrinho baixo que tem uma perna só, andando aos saltos. Fuma um cachimbo e tem à cabeça um barrete vermelho, carapuça que lhe dá poderes mágicos como aparecer e sumir repentinamente. É muito brincalhão nada o que faz é por maldade, mas apenas para se divertir. Suas brincadeiras são incontáveis: Espalha cinzas de fogões apagados; tira das galinhas poedeiras ovos de seus ninhos; impede os cavalos de correrem puxando-lhes os rabos; dá assobios repentinos no ouvidos de viajantes ; mistura sal em recipientes de açúcar; enfim, faz tudo com uma grande gargalhada , em alegre diversão.
 O Saci foi aproveitado na literatura por Monteiro Lobato como personagem em seu “Sítio do Pica-Pau Amarelo”. Quando então este mito tornou-se muito conhecido.
   Está hoje espalhado em todo o Brasil, mas é mais cultuado na zona onde foi originado na região das missões. Entre os índios era chamado de “Yaci Yaterê”.

O Negrinho do Pastoreio - Uma das lendas mais caras aos gaúchos é sem dúvida esta do Negrinho.
   Foi muito contado pelo tempo em que no Séc. XIX em nosso país lutávamos pela abolição da escravatura, tentávamos mostrar a condição humilhante em que vivia os nossos escravos negros.
   Trata de um estancieiro muito cruel que possuía um menino negro de 14 anos como escravo. Este não fora batizado, então, como não tinha padrinho ele próprio se dizia afilhado da Virgem Maria. Também nem nome lhe deram sendo simplesmente chamado de Negrinho.



  Impassível e humilde galopava pelas coxilhas treinando um cavalo baio muito lindo a vários outros.  Um dia o estancieiro o ordenou pastorear mais de trinta cavalos, mas num descuido, ele deixou justamente o cavalo baio soltar-se, se perdendo. Dando falta do baio, o estancieiro deu inúmeras chibatadas no Negrinho deixando-o a sangrar e depois o colocou preso sobre um formigueiro certo de que aquele enxame de formigas o mataria.
   Alguns dias depois foi até o formigueiro e o encontrou de pé com o corpo livre de qualquer marca e ao seu lado estava a Virgem Maria, testemunhando que o escravo menino já estava no céu, mas na companhia de sua madrinha. Desde então, é visto nos campos um negrinho montado num cavalo baio tocando um pastoreio. Dizem que ali ele está sempre procurando um objeto que alguém perdeu. Um objeto perdido requer de nós que façamos uma oração ao Negrinho e acendamos uma vela, que ele então vai pôr num altar à Nossa Senhora.  Logo, o objeto estará à vista de quem o perdeu.
Entre as canções gaúchas esta essa: "Negrinho do pastoreio, acende esta vela pra mim! Espero que me devolvas a querência que perdi!".

sexta-feira, 7 de setembro de 2018

Livros de Setembro

Os dois livros mais procurados neste último mês entre os meus editados são:


Sobre as diversas categorias dos mitos.
Romance sobre a Espanha do séc. XV e
as perseguições a árabes, judeus e ciganos.

Valor: R$ 30,00 cada
Informações e vendas pelo e-mail: helyetterossi@gmail.com 


Mitos e Ritos nos Terreiros da Afro-brasileira

Obá servindo sua orelha a Xangô
sob a influência de Oxum.

Ritos e mitos são inseparáveis no Candomblé. Diz o grande historiador Mircea Eliade que o mito revela a necessidade de um povo de tradição apenas oral de registrar seus feitos históricos. Por exemplo:
   Quando uma iniciada incorpora o orixá Obá, e dança escondendo a sua orelha e aquela que incorpora Oxum dança levantando os pés estão teatralizando uma estória de rivalidade entre as mulheres de Xangô.
   Xangô vivia com três mulheres. Iansã, Oxum e Obá na cidade de Oyá, na Nigéria e todas queriam agrada-lo. Porém, Oxum tinha mais conhecimento de cozinha e a comida que fazia contentava muito Xangô. Obá admirava muito este conhecimento de Oxum.
   Um dia Xangô ia dar um banquete para autoridades e Obá foi se aconselhar com Oxum e lhe disse: Tudo o que você faz agrada Xangô e eu não consigo agrada-lo. Gostaria que me ensinasse o segredo de seus temperos.
     Oxum pensou: a troco de que eu vou fazer o amor de Xangô aumentar por esta mulher? Então disse: Você não reparou que meus penteados sempre cobrem as minhas orelhas? É porque eu descobri que pedaços delas dá um gosto todo especial às comidas. Não fala o meu segredo para ninguém. Obá voltou para seu quarto, cortou uma orelha e padecendo dores em silêncio, colocou-a no prato que iria servir e pôs um turbante para esconder o ferimento.
Oxum à beira do rio
que leva o seu nome...
   Quando Oxum apresentou seu prato, os convidados disseram nunca haver comido nada tão saboroso. Porém, quando Obá ofereceu o seu, um convidado viu uma orelha boiando no molho, e horrorizados todos os convidados se despediram revoltados com Xangô.
   Xangô quis saber de Obá o que houve e ela respondeu: Oxum também costumava por pedaços de orelha nos pratos e ela achou que pondo uma inteira ainda ia ficar melhor. Fizera isto para agrada-lo. Mas quando o turbante da cabeça de Oxum foi levantado, viram as suas orelhas perfeitas e foi Obá quem passou por mentirosa e Xangô ficou furioso com ela. Assim, uma iniciada incorporada com Obá sempre esconderá as suas orelhas.
   Contudo, Obá foi contar para Iansã como Oxum a enganara. Iansã ficou com pena dela e prometeu que a iria vingar. Aconteceu nova festa e Oxum para chegar ao palácio de Xangô, precisava passar por um caminho de terra.
Iansã pôs então sob todo o caminho muitas brasas acesas e cobriu-o caminho com a terra. Quando Oxum passou por ele queimou os pés. Mas na festa era obrigada a dançar com os convidados de Xangô para homenageá-los. Então a cada passo e dança que dava  levantava com muita dor seus pés. Hoje, nos terreiros as iniciadas recebendo Oxum lembram e teatralizam esta estória capengando a cada passo dado.

Tristão & Isolda

Versão medieval de Tristão e Isolda.

Desta linda estória permanece a dúvida: Seria ela lenda ou realidade?  Tristão seria um príncipe de um pequeno reino francês. Ganhara este nome porque sua mãe morrera no seu parto. Como sua madrasta o desprezava foi criado na Inglaterra por seu tio, um homem muito rico de nome Mark.
   Um dia, o tio teve um problema com um homem irlandês que queria mata-lo em razão de uma dívida. Então, Tristão já rapaz, desafiou tal homem a um duelo e acabou por mata-lo. Seu tio resolveu que Tristão deveria ir á Irlanda contar sobre o duelo, porque uma combinação feita com a família deste dizia que uma vez o irlandês morto, a dívida estaria salda. Lá chegando, conheceu Isolda, a sobrinha do irlandês morto. Quando, porém a pediu em casamento a mãe de Isolda, que via nele apenas o matador de seu irmão, rejeitou o seu pedido.
   Voltando Tristão à Inglaterra, passou a falar ao tio Mark sobre a grande beleza de Isolda, sua delicadeza finura. Enfim, em todos os seus dotes que o maravilhara. Falou tanto e tanto que o próprio tio Mark acabou por apaixonar-se por Isolda. Vendo a impossibilidade de um pedido de Tristão ser aceito, resolveu ele próprio pedi-la para si em casamento.
   Tristão era sempre tão grato ao tio, que não quis concorrer com ele. Voltou à Irlanda e fez o pedido. A mãe de Isolda o aceitou de pronto, pois via no riquíssimo senhor inglês um pretendente para ninguém desprezar. Porém, ela sabia que Isolda era apaixonada por Tristão.
    Arquitetou então o seguinte: Mandou fazer um filtro afrodisíaco mágico e entregou-o a serva que acompanharia Isolda a Inglaterra para encontrar o noivo. Bem recomendada à serva de por o filtro nas taças de Mark e Isolda quando estes fossem brindar o noivado para que se apaixonassem.
   Tão tola, contudo, foi a serva que enganou-se, pondo o filtro nas taças de Tristão e Isolda. O não esperado então aconteceu: a paixão entre ambos cresceu e Tristão que, continuando leal ao tio havia renunciado a ela, embora o casamento entre o tio e Isolda acontecesse, passou a ser seu amante.
   O tema passa a versar sobre o sentimento de culpa de Tristão e o ciúme do tio. Quando comentários sobre o relacionamento dos dois amantes veio à tona o tio desesperou-se. Apesar de amar muito o sobrinho o afastou, mandando-o de volta para a França.

Tristão e Isolda mirtos de Amor...

    Tristão chegou a casar-se com uma mulher de nome Isolda, na esperança de assim ser feliz, mas não conseguiu. Participou de batalhas para expor a vida, e acabou sendo ferido e ficou à morte. Enviou então um escudeiro ao tio na Inglaterra lhe fazendo um pedido: Que o deixasse ver Isolda antes de morrer. Combinou então com o escudeiro que se o tio aceitasse seu pedido, quando a embarcação que a traria estivesse chegando que fosse hasteada uma bandeira branca, porque da janela onde estava ele já se alegraria. Quando ouviu o apito do barco, ele ansioso da cama, antecipadamente já perguntou a esposa: Que cor de bandeira traz? Esta, sabedora da combinação feita, ciumenta, respondeu: Negras. Pelo choque tão violento de não mais ver Isolda, antes que o barco chegasse trazendo-a, já havia morrido.
   Ela, enfraquecida pelos anos de sofrimento pela distancia que viveu de Tristão, morreu pouco depois ali mesmo na França.
   O tio Mark, sempre dividido pelo amor que tinha ao sobrinho e a Isolda, quando soube da morte de ambos ,mandou buscar seus corpos e os enterrou em duas sepulturas paralelas.
    Diz a estória que ao lado da sepultura de Tristão nasceu um pé de uva e no lado de Isolda nasceu uma roseira Quando as duas árvores cresceram, se entrelaçaram uma na outra. Então, o ciúme do tio aparecia novamente.  Cortava-as com frequência, mas elas tornavam a crescer e se entrelaçar. Quando, em desespero, elas foram arrancadas. Tornaram a nascer. Enfim, nem após a morte aquele casal dava-lhe descanso.
Tristão e Isolda é um magnifico drama de Richard Wagner.

terça-feira, 21 de agosto de 2018

Atlântida - Realidade ou Fábula?

Visão de uma Atlântida submersa.

De todos os locais misteriosos que levantam especulações, tais como Stonehenge, a pirâmide de Quéops e a Esfinge egípcia, as linhas peruanas de Nasca, Atlântida, sem ter deixado, como estes, vestígios visíveis, é certamente o que mais fascínio vem exercendo no imaginário dos povos.
   Muitos o vêm como um Éden perdido, dedicando-se até as incansáveis buscas para encontra-la ,outros a têm como um paraíso mítico, lendário.
   A divergência entre a realidade ou não de sua existência teve início desde que o filósofo grego Platão, no século IV AC., descreveu-a em sua obra Timeu e Crítias. Nesta obra ,em um diálogo, o personagem Crítias revela como num continente submerso , o seu povo conseguira um governo perfeito, harmonioso, tal como idealizado pelo próprio Platão em sua genial “República”, obra que fora recentemente terminada.
   O conhecimento de tal sociedade paradisíaca lhe teria sido revelado por Sólon, sábio grego, que por sua vez o obtivera de um sacerdote quando estivera no Egito.
   A exposição de tal sociedade foi feita na obra platônica com tais detalhes que levantou uma grande dúvida: Teria Platão desejado através de uma ficção, por à tona uma narrativa que ele realmente ouvira e dera crédito?
   A repercussão do escrito de Platão teve tal relevância na época, que tanto os seus seguidores platônicos como os aristotélicos entraram em acirradas disputas verbais, os primeiros optando pela veracidade do que fora narrado e os outros concluindo que Platão achara um bom tema que lhe resultaria num sucesso literário.
   Uma realidade histórica fluía das minúcias com que Platão descrevia aquele imenso território insular, localizado-dizia ele- além do estreito de Gibraltar, em pleno oceano Atlântico e que contava com cidades de mansões e templos revestidos de prata, ouro, cobre, e marfim.
   Além disso, Platão insere em textos de sua obra, que poderiam ter ficado apenas como ficcionais, afirmativas próprias de que tudo era realmente referência a fatos verdadeiros. Segundo o sacerdote egípcio informara a Sólon - dizia Platão - os egípcios guardavam em sua memória histórica, que retrocedia há nove mil anos, a lembrança de uma grande catástrofe diluviana, que pusera término a adiantada sociedade de Atlântida, levando seu continente a submergir no fundo das águas. Acrescentando ainda que isso se deveu a uma decadência moral, que levara os Atlantes sábios e virtuosos a uma arrogância onde se tornaram desejosos de estender seu poderio e dominar outras terras.
   No entanto, toda esta aparência verdadeira imprimida em seu relato, dava também margem às controvérsias, uma vez que Platão introduzia nele partes absolutamente míticas. Dizia que Atlas, o mais forte dos Titãs mitológicos, fora o responsável pela construção do imponente templo de Atlântida, erguido em homenagem a Poseidon. E, que este aliás ,foi quem escolhera gerar parte de sua descendência naquela região de Atlanta, na ocasião em que - segundo os mitos gregos - os três irmãos Zeus, Poseidon e Hades, dividiram o mundo entre si. Também atribui ao próprio Zeus castigar os desmandos dos Atlantes com a submersão de seu território.

Localização de uma presumível Atlântida.
   
Assim, Platão conseguiu levantar esta dúvida: Atlântida é realidade ou fábula?
   Modernamente, nos séculos XIX e XX, mitos defensores da veracidade de Atlântida surgiram para levantar apaixonadamente a questão. Todos ligados não à ciência, mas ao esoterismo. Tivemos a russa Blavatsky, famosa por sua obra ocultista “A Doutrina Secreta”. Nela, corrobora todo o relato platônico. Também o filósofo austríaco Rudolf Steiner, criador do movimento místico da Antroposofia e principalmente o trabalho detalhado sobre o continente submerso, de um agricultor americano Edgar Cayce que já granjeara projeção por seus notáveis poderes paranormais.
   Estes três estudiosos e mais uma quantidade imensa de escritos surgidos nestes séculos, levantaram novamente tal assunto.
   Quanto à posição científica, alguns sismólogos já se dedicaram e ainda se dedicam a uma busca mais direcionada para o relato do grande dilúvio. Porém, em sua grande maioria, os grupos científicos conservam-se céticos a respeito preferindo jogar a Atlântida para o terreno do imaginário, do mito.
   Sem dúvidas, pensar em Atlântida é por à tona uma questão milenar que continua fascinando muitos.

O Mito de Ganesha


Parvati, deusa indiana, era esposa de Shiva, mas cada um deles vivia em seu próprio palácio.
    Parvati possuía um Gana (espécie de anjo tutelar, gênio protetor, que a defendia de todos os males) Ele se chamava Ganesha.
    Shiva era um marido muito apaixonado e impaciente que, com frequência, invadia, sem a permissão da deusa, o seu castelo para vê-la, incomodando a privacidade de Parvati. O que a contrariava muito.
    Parvati encarregou então Ganesha de impedi-lo de entrar a não ser que ela própria chamasse Shiva.
    Shiva entrou então em luta aberta contra o Gana. Mesmo com a intervenção do Deus Brahma, ser supremo de extrema bondade, que tentava acalma-los, a luta cada vez se intensificou mais, resultando por Shiva cortar a cabeça de Ganesha, o degolando.
    Parvati ficou desesperada com a morte do seu gênio protetor. Shiva, por sua vez, sentiu-se muito arrependido por tê-la feito sofre tanto e foi pedir-lhe perdão. Ela porem, lhe exigiu: Só o perdoaria se ele ressuscitasse Ganesha.
   Contudo, o corpo do gênio não contava mais com a cabeça. Shiva então ordenou a um subordinado que lhe trouxesse a cabeça do primeiro ser que encontrasse. Este primeiro ser encontrado foi um elefante, e sua tromba foi colocada no morto e Shiva com o seu poder de um grande deus o ressuscitou. É por esta razão que Ganesha com sua cabeça de elefante é o Gana, o deus gênio, mais amado dos indianos.

domingo, 29 de julho de 2018

Três Iniciados


Apolônio de Tiana

     Célebre iniciado, filósofo e professor neo pitagórico nascido na Capadócia no ano dois antes de Cristo, morto em Éfeso, quando a cidade de Tiana era integrante do Império Romano. Foi iniciado no templo de Esculápio, onde além da medicina, se dedicou às doutrinas pitagóricas, tendo adotado então o ascetismo como hábito de vida. Alimentava-se apenas de frutas e legumes, andava descalço.

     
Manteve então um juramento de fazer silêncio durante cinco anos. Depois desta ascese, partiu da Grécia, visitou a Babilônia e a Índia absorvendo o misticismo oriental dos Brâmanes. Lá, foi recebido e participava em seus cultos já como um grande sábio. Sua vida é repleta de milagres descritos por seu discípulo mais importante, Damis. Previa o futuro, curava enfermos.
     Quando ainda em Éfeso, previu e acertou na vinda de uma grande epidemia de peste que assolaria a cidade, o que lhe aumentou muito o prestígio. Viajou pela Espanha e Itália, tendo nesta restituído a vida do filho de um senador romano. Faleceu com 100 anos numa vida de muita compaixão. Afirmava sempre aos políticos: Se você deseja governar, abstenha-se do sangue dos inocentes! Seja misericordioso!
   Sua fama continuou grande até aproximadamente 272 D.c. Muitos comparam a sua personalidade à de Jesus. Sua mensagem não teve, porém a mesma sorte do Cristianismo, pois este, no quarto século depois de Cristo, conseguiu que Constantino, imperador do império Romano, o tornasse a religião oficial do Estado, criando assim o alicerce de onde cresceria o grandioso movimento do Cristianismo, magnífica religião atual.
    A única grande obra que temos sobre Apolônio, nos veio do famoso escritor ateniense Flavio Filóstrato. Um escrito romanceado intitulado “A vida de Apolônio”. Nela, Filóstrato afirma que, assim como Jesus, Apolônio também nasceu de uma virgem.
    O Espiritismo o vê como um dos grandes exemplos de Médium dos tempos antigos. Num episódio, um governador seria linchado em meio a uma grande feira, por uma multidão enfurecida, acusado de um crime que não cometera. Apolônio (então em período de silêncio) apenas ergueu os braços e a sua figura de asceta e a majestade de seu porte tranquilizou o povo e salvou o governador. O Espiritismo atribuiu seus muitos milagres a uma poderosa mediunidade. A doutrina de Apolônio seguiu sempre os pensamentos doutrinários de Pitágoras. Foi ele um de seus maiores difusores.

Pitágoras

   Nasceu em Samos na Ásia Menor (então chamada de Grécia Asiática). Sua mãe foi ao templo de Delfos fazer a costumeira consulta aos nascituros pela Pitonisa. A Pítia, sentada num banquinho sobre uma fenda aberta no chão de uma caverna, aspirava os vapores de folhas de louro queimadas, entrava em transes dos quais lhes vinham as respostas. Eram então chamadas de “Sacerdotisas de Apolo”, pois segundo a crença geral, era este deus que as inspirava.
   Na consulta da mãe de Pitágoras, lhe foi dito que seu filho seria útil para todos os homens em todos os tempos. Como rapaz, foi estudar no famoso templo de Mênfis no Egito e ali iniciou-se durante longos vinte e dois anos. Passou pelos medos e êxtases das iniciações de Isis, depois fez a iniciação da catalepsia (morte aparente) e a ressurreição ofuscante de Ozires. Dedicou-se ao principal culto egípcio, aquele do sol em Heliópolis.


   Quando Cambises, rei persa, invadiu o Egito, saqueou os templos de Mênfis e Tebas e destruiu o de Amon em Carnac. Pitágoras assistiu ainda o faraó Psamético ser arrastado a ferros e foi ele próprio exilado para a Babilônia. Lá, Pitágoras encontrou uma babel de línguas e três grandes religiões: A dos antigos Caldeus, o magismo dos Persas e o Judaísmo dos sobreviventes do cativeiro judeu na Babilônia.
   Isto lhe proporcionou um imenso campo de sabedoria e observações que se somaram àquelas já assimiladas no Egito.
   Após doze anos cativo ali, conseguiu voltar à Grécia, terra que sempre fora abençoada por abrigar o santuário de júpiter em Olímpia e o de Ceres em Elêusis durante os tempos homéricos. Principalmente voltava após trinta e quatro anos, ao local que tanto amava: o sagrado templo dórico de Apolo. Ali, o templo era belíssimo, porque sendo visitado por toda a Grécia, recebia oferendas muito ricas como aquelas estátuas de ouro puro que faziam fileiras em sua alameda.
   Chegando, reabilitou as reuniões das assembleias dos idosos (Anfictiões), que ali existiam desde o tempo de Orfeu, mas já estavam, porém em decadência. Fez ressurgir o templo ao seu antigo prestígio com suas maravilhosas instruções e palestras. Após ter instruído sacerdotes, dedicou-se a preparação de sua mais capacitada discípula, Teocléa, em sua doutrina esotérica e idealista. Deixou-a depois encarregada da continuidade de seu trabalho e foi para a Itália, para a cidade de Crotona.
   Em Crotona, mostrou a sua fascinante personalidade. Chegou pelo fascínio com que pregava ser chamado pelas mulheres de “Júpiter” e pelos homens de “O Apolo Hiperbóreo”.
   Sua sedução era tão forte que o Senado de Crotona o convocou para explicar e justificar os meios magos que ele usava para atrair tanto o espírito das pessoas.
   Criou em Crotona uma Ordem, com uma sessão para mulheres onde lhes proporcionava uma iniciação paralela à dos homens. Em pouco tempo erguia-se na cidade um edifício com jardins. Os crotonenses chamavam o edifício, pelo seu trabalho com mulheres, de “templo das Musas”.
O instituto pitagórico ficou conhecido principalmente pelas suas simbologias da matemática do universo e da “música de suas esferas”. Ensinava artes, espiritualidade, filosofia e cosmogonia. Suas iniciações constituíam-se em 4 degraus: Preparação (0 noviciado); Purificação (os números, teogonia); Perfeição (evolução da alma); Epifânia (a mulher iniciada, o adepto, o casamento).
   Aos sessenta anos Pitágoras casou-se com uma discípula: Teana. Com ela teve três filhos e após a sua morte aos noventa e poucos anos Teana foi o centro do que sobreviveu da Ordem pitagórica.
   A Ordem sucumbiu à cólera e a inveja de uma cidade inimiga: Sibaris.  Aconteceu que quinhentos exilados, fugindo aos horrores em que viviam,
pediram refúgio aos crotonenses. Estes os receberam. Quando o governo de Sibaris exigiu a extradição dos refugiados, Crotona com receio de represálias ia manda-lo de volta, mas Pitágoras, homem de extrema bondade, influenciou os de Crotona para não devolver para os horrores aqueles pobres refugiados. Sibaris então mandou um exército para cercar o Instituto pitagórico e incendiá-lo. Pitágoras morreu queimado junto a mais 38 iniciados que ali estavam. Apenas dois escaparam. Há, porém versões que dizem ter Pitágoras se salvado e existem cidades que durante um tempo disputavam ser proprietários de suas cinzas.
   A Ordem depois se dispersou e as sementes de espiritualidade deixadas por este magnífico mestre espalhou-se muito na Grécia e na Sicília. O trabalho durou ainda uns 250 anos e suas ideias ainda vivem hoje. A principal obra antiga que temos de Pitágoras foi: “Timeu” de Platão.

Krishna, o Verbo Divino


   Principal figura do Hinduísmo, é o oitavo Avatar de Vishnu (o deus preservador da Trindade Hindu). Nasceu em 3228 A.c. Há mais de 5000 anos, em Mathura, norte da Índia. Nasceu sem ser fruto de união sexual, mas por uma mentalização feita pelo marido de sua mãe, Devaki, sobre o ventre dela.
   Já rapaz, tem profundo amor ao sábio Vasixta e quando este morre se recolhe durante sete anos apenas meditando e sai depois a pregar. Entre os seus muitos jovens ouvintes encontraria o seu maior discípulo: Arjuna. Este era um príncipe que teve o seu trono perdido, usurpado por seus parentes os Kurus. Arjuna era agora da tribo dos Pandavas mas também descendente do rei Kuru. Porem, não tem força suficiente para lutar pela reconquista de sua tradição familiar, do trono que perdera.
   Este será o enredo da belíssima epopeia guerreira do Bhagavad Gita (A Canção do Senhor), parte da antiga obra hindu, o Mahabharata. Ali aparecerá a personalidade divina de Krishna, os seus magníficos ensinamentos à Arjuna.
   Muitos não entendem ao lê-lo, porque Krishna, a suprema bondade, manda que Arjuna mate os seus parentes. Porém, luminares como Mahatma Gandhi e Rabindranath Tagore interpretam o Bhagavad Gita em seu sentido simbólico. Compreenderam que Arjuna é o Eu humano cujo reino da felicidade foi tirado pelo Ego e que este não tem força para reavê-lo. Seus parentes representam o orgulho, o desrespeito, a maldade, a traição. Enfim, todos os males de sua consciência que Arjuna tem que vencer. Krishna chama a atenção de seu discípulo para que ele faça sua autorrealização. Através de belos diálogos da epopeia lhe aconselha a não deixar que lhe tirem os seus poderes divinos.
   Só compreendemos o Bhagavad Gita, a luta entre Kurus e Pandavas quando entramos em seu sentido simbólico, nos lembrando sempre que os povos antigos tinham como hábito usar alegorias, parábolas e símbolos para expressarem as suas Verdades .
   Krishna, rapaz, era um sedutor tocador de flauta que apaixonava todas as pastoras. Porém Krishna é o amor impessoal que ama igualmente todas as pastoras e todos os seres. As pastoras tem que ter por ele o amor devocional por um ser superior, para com um Avatar, amor que é chamado no Hinduísmo de Bhakti. Hoje, organizações espiritualistas promovem o desenvolvimento de seus adeptos através apenas da devoção, da Bhakti, usando como um dos recursos a Bhakti Yoga. Existem muitas imagens de Krishna entre as pastoras e em companhia de vacas, o seu animal predileto, muito sagrado então na Índia.
   Krishna apaixona principalmente a pastora Rhada e a poesia indiana fala muito nesta relação muito estreita entre os dois. Também este amor é estudado alegoricamente como o simbolismo do par feminino e masculino existente em cada Ser, que em Krishna já atingiu uma complementação harmoniosamente perfeita.
   A doutrina de Krishna ensina que o homem vive uma estrutura tríplice: Satwa, Radja e Tamas. Se alcançou a total sabedoria ou um estado de deslumbramento entrou em Satwa. Se está ainda indeciso passando de um conceito a outro, da matéria à espiritualidade vive o círculo vicioso de Radja. Se abandonou-se completamente aos seus instintos está em Tamas, a ignorância total. Porém, dizia que a consciência da Unidade é o que supera tudo, até mesmo a sabedoria.
   Segundo as escrituras, a morte de Krishna se deu em 3102 a.C. e marca o fim da” Idade de bronze”, o Divapara Yuga e iniciou a “Idade do ferro”, o Kali Yuga , a 4° e última de um Kalpa (ciclo evolutivo) que dará início a uma nova “Idade de Ouro”. O Kali é a idade das trevas, da degradação, esta em que estamos.
   Tal como afirmou Krishna para seu discípulo Arjuna no Bhagavad Gita, todas as vezes que o homem decai, entra em necessidade espiritual, Ele, como o Avatar da preservação das leis perfeitas de Brahma, toma forma humana para vir auxilia-lo.
  Em 1966 foi fundado em Nova York o movimento do Hare Krishna que possui hoje uma quantidade imensa de seguidores no Ocidente, identificados pelo mantra, que emitem cantando repetidamente. Tal Movimento está baseado no Hare Krishna  das escrituras védicas dos tempos arcaicos da Índia.

quinta-feira, 24 de maio de 2018

O Povo Cigano de Sara

Santa Sara.

O dia 24 de Maio é aquele consagrado à santa Sara padroeira dos ciganos.
             Em regiões como a de Camargue na França e especialmente na Provence, as peregrinações para onde ocorrem ciganos do Egito e da própria Europa, já é uma tradição secular.
             Tais homenagens à Sara se estendem até o dia 25, levando em procissões sobre andores enfeitados de cores vivas, a imagem da santa de pele tão escura quanto à dos ciganos e em muitas tendas espalhadas pelo mundo ela é cultuada.
         Lembrei-me então de minha visita anos atrás á Provence onde cheguei a assistir tais festividades e me foi narrada a seguinte história, talvez lendária:
           Por volta do ano 70 após o Cristo, fugitivos das perseguições aos cristãos na Judeia, a deixou, tomando um barco muito tosco, com poucas condições de navegar, o que provavelmente os teria afogado. Porém, por um milagre, através do Mediterrâneo conseguiram aportar numa praia ao sul da França, ficando depois o grupo abrigado na região do Camargue. O grupo contava então com 3 Marias: Maria Madalena, Maria Salomé, Maria Jacobé e Marta.

Igreja de Les-Saint-Maries-de-la-Mer.
              
Lenda ou não, o certo é que o local, que ao chegarem chamava-se “Le petit Rhone”, passou a chamar-se “Les-Saintes-Maries–de-la Mer”. Com elas veio também uma cigana egípcia de nome Sara, serviçal de uma das Marias.
             Na convivência com elas certamente foi quando a cigana adotou o Cristianismo que se espalhou depois entre o seu povo, hoje constituído de agrupamentos devotamente cristãos (lembremos que a estátua de Nossa senhora Aparecida do Norte é também intensamente venerada pelos ciganos brasileiros).
            Como a tradição cigana é absolutamente oral (jamais registraram por escrito a sua História) todas as conjecturas sobre a origem do povo de Sara são enevoadas, envoltas em mistérios. Contudo, os ciganos contam entre eles com muitos anciãos que são exímios narradores. Esses afirmam ter o povo cigano a sua origem na Índia. Isto será bem possível, pois os estudiosos de línguas nos dizem que o Romanê, língua cigana, tem incontestes raízes nos idiomas mais antigos da Índia.
             Ali, teriam sido nômades, sempre em movimentação. Não eram bons cavaleiros, mas criavam, tinham e negociavam cavalos, que usavam para puxar suas carroças condutoras de apetrechos de suas tendas, à cada mudança feita. Quando pararam por um tempo mais longo, foram perseguidos por tribos muito aguerridas, o que os obrigou a se espalharem pelo mundo, sendo o seu primeiro lugar a habitar, o Egito.
            Outras narrativas de anciãos jogam suas tradições também para um tempo bem distante pois contam que já pela época de Júlio Cesar (Séc.V A.C.) já havia ciganos em Roma. São descritos trabalhando ali em circos, fazendo mágicas e bruxarias, contando histórias, prevendo catástrofes através de símbolos. Era lá uma classe social marginalizada a qual os tributos devidos à Cesar eram cobrados com violência . A eles só cumpria obedecer.


Crianças ciganas.

            Aliás, os ciganos sempre foram perseguidos. Na Idade Média, a Inquisição os perseguiu pois suas práticas de tarólogos, astrólogos, quiromantes, seus trabalhos com pêndulos, leituras em copo d’água, jogos moedas, eram todos rotulados de bruxaria.
            Na Idade Moderna tiveram as perseguições do Nazismo. Por elas morreram 600.000 ciganos.  Suas peles escuras nada os favorecia em meio a uma doutrina arianista que refugava aqueles que não a tivessem clara para serem considerados da “raça pura” ariana. Assim como os judeus, também foram levados à Campos de Concentrações.
            Há uns séculos atrás a maioria cigana eram analfabeta, mas a modernidade a contagiou e já no Séc. XX  encontramos muitos de seus descendentes estudando. São já ciganos sedentários. Há uns 27 anos, uma pesquisadora, diretora do Centro de Estudos Ciganos no Brasil, publicou várias obras e inúmeros artigos sobre a sua cultura. Nele, nos conta as entrevistas que teve com ciganos formados em advocacia, medicina, professorado, psicologia, antropologia  e entre eles já mulheres com cursos secundários.
          No entanto, mesmo influenciados que sejam pela modernidade, não abandonam seus hábitos diários seculares. Quando constroem uma casa já a situam em grandes terrenos para colocarem ao lado uma tenda. Alguns entrevistados  da pesquisadora lhe afirmaram se sentirem emparedados, tolhidos em sua liberdade se não se proporcionarem de tanto em tanto dormir na tenda. Geralmente dormem pouco e o importante é saírem à noite para sentirem as estrelas sobre suas cabeças.
          A selva de pedra de nossas metrópoles não os atrai. Preferem viver em cidades pequenas onde através de suas organizações administrativas (e hoje elas já são algumas) podem recorrer a vereadores e prefeitos amigos para lhes proporcionarem local onde colocar suas tendas
          Pela própria vivência de percorrerem países,  assimilam alguns de seus hábitos, do que resulta grupos diferentes entre si. Assim temos os grupos Calon, o Rom, o Kalderashi, o Ragare. Porém, são pacíficos e nunca ouvimos notícias de lutas entre eles.
          Prezam a amizade e quando uma afinidade é grande entre duas pessoas, podem sacraliza-la fazendo entre si um pacto. Dão uma picada de agulha nos dedos de ambas  e depois uma chupa uma gota de sangue da outra, estando assim ritualizada uma amizade eterna. Costumam firmar relações com amigos  com encontros chamados “brodes”, espécie de saraus onde dançam, contam historias e declamam poesias.


Cartomante cigana.

         Quanto a sua religiosidade são monoteístas, nunca se envolveram com deuses. Cristão, creem na vida pós a morte, não exatamente como faz o Espiritismo no seu intercâmbio com desencarnados, mas como supersticiosos que são os ciganos, temem as almas de falecidos que podem, conforme pensam, vir a lhes cobrar algo. Acreditam na alma imortal que chamam de “Mulé”.
          Seus casamentos são monogâmicos e as meninas são dadas em casamento muito cedo, logo que lhes aparece a primeira menstruação. Geralmente é requerida a virgindade a mulher noiva. Dificilmente veremos um cigano casado com uma não cigana e vice versa, pois são muito zelosos da preservação genética da sua raça.
        Sobrevivem com homens (refiro-me aos não letrados) fazendo lindos tachos, utensílios e pingentes de cobre, colchas, tapetes. As mulheres (que são mães amorosas) contribuem para as finanças domésticas com a Quiromancia e a Cartomancia. Com elas asseguram ter sempre belas  bijuterias que tanto gostam de usar.
        As lendas narradas pelos anciãos são de grande beleza como esta: Um cigano violinista sonhava que um dia um pássaro conseguisse reproduzir as suas belas melodias. Esperou por isto toda a sua vida. Um dia ficou velho e morreu. No mesmo dia, sobre uma galho, surgiu um pássaro muito amarelo e cantou, cantou, imitando a melodia do violinista. Assim nasceu o Canário que reproduz, com perfeição, toda a magia de um violino cigano.
       Aqueles ciganos já letrados, devido talvez pelo seu milenar amor pela natureza, tendem a ser poetisas e poetas inspirados. Aqui, reproduzo um verso  de Any Reis do grupo Ragari, tirada do livro “Lendas e histórias ciganas” pág.154.
                                     
                                             Somos  
                                                           
Livres como os campos                     imprevisíveis como a estrada
Misteriosos como o mar                    leves como o ar
Andantes como o rio                         Argutos como a raposa 
Secretos como os bosques                 Sentimentais como a musica
Ligeiros como os ventos                   Verdadeiros como as crianças
Ardentes como o fogo                   Incompreendidos como a verdade
Cautelosos como a noite                   Assim somos nós, ciganos.


       Em um povo onde os seus fatos históricos não foram registrados, que suas tradições se difundem de boca à ouvido, é possível que o destino de sua cultura seja ir pouco a pouco se perdendo.
       Porém, mesmo que o povo de Sara desapareça, nós jamais o esqueceremos. Nossas crianças continuarão a lembrar de suas habilidades de acrobacias nos circos, a lembrarem da paixão dos ciganos pelos picadeiros; teremos no pensamento a inigualável destreza e graça com que dançam numa  apresentação de Flamenco; Continuaremos a sonhar com a sorte que nos foi favorável numa leitura de mãos; E, podemos ainda, seguindo o exemplo dos ciganos, pedir à santa Sara que esta sorte favorável nos seja concretizada.