domingo, 29 de setembro de 2019

O Saudosismo Criando Mitos de Retorno

   Todos os povos prezam a memória de seus ídolos passados, mas alguns fazem mais: Seu imaginário popular acredita firmemente em suas voltas míticas para liberta-los de momentos adversos.
O retorno de Jesus...
   O Cristianismo crê na Parúsia, o segundo advento do Cristo. Já na Apocalipse a Bíblia dizia que Ele viria lutar contra uma figura bestial: O Anticristo. Introduziria uma nova era de paz conhecida como o Millennium, pois duraria mil anos. Jerusalém se tornaria então a capital do mundo e os Judeus reconheceriam por fim a figura de Jesus como o messias esperado em suas profecias.
   O Sebastianismo foi durante mais de um século o messianismo português. D. Sebastião, neto de D. João III, no século XVI gerou uma crença em seu retorno, após ter desaparecido, sem deixar vestígio de um corpo, no norte da África, durante a batalha de Alcácer-Quibir em 1578, quando foi combater islâmicos do Marrocos.
   Passou-se então a acreditar numa volta sua pondo término à crise dinástica que pôs os reis espanhóis no trono português. Afirmava-se até que ele, chamado já tanto de “Capitão de Deus” como de “O Rei Encoberto”, surgiria numa manhã de muito nevoeiro e que restabeleceria toda a glória perdida de Portugal, esperança que naturalmente nunca aconteceu.
   Também no Islã, segundo o Alcorão (43,61) Jesus retornará aparecendo em Damasco , como redentor do Islamismo. Unir-se–ia ao Madi iluminado em sua guerra contra um Anticristo inimigo do Islã. Tornar-se-ia um governante islâmico de grande justiça.
   Surpreendentemente Alice Bailey, uma renomada esotérica ocultista, fala em seu livro “Magia Branca” que a pessoa de Jesus voltaria em uma nova encarnação entre os Drusos do Líbano. Estes, Ismaelitas (Filhos de Ismael), Xiitas do Islã. Grupo muito místico que acredita em reencarnações e são também pacíficos, não se envolvendo em lutas. Enfim, Jesus retornaria como um islâmico não fundamentalista, amante da paz, para uma esperada renovação pacífica do Islamismo.
   Já no Hinduísmo, Paramahansa Yogananda em sua obra “Autobiografia de um Yogue” interpreta a Parúsia misticamente. Seria uma grande mudança interior que aconteceria brevemente em cada indivíduo, introduzindo no mundo uma era de fraternidade.
   Entre as duas facções rivais dos Xiitas islâmicos estão os “Filhos de Ismael” e os “Filhos de Musa”. Entre os últimos, estava Musa como seu mais amado Imã. Os Filhos de Musa creem que em sua descendência estarão 12 Imãs (Iluminados). O próprio Musa desapareceu de modo misterioso. Saiu a cavalo e este voltou só e Musa jamais foi visto. Então, seus “filhos” acreditam que um dia ele voltará como o duodécimo Imã, como um messias que espalhará o Islã em todo o mundo, o que é o ideal último de todo Islâmico.
   O Budismo Tibetano antecipou-se a todos os Retornos idealizando uma outra encarnação do seu grande Avatar, Bodhisatwa Avolokitsvara: Fê-lo renascer na figura impar e mais adorada do budismo chinês: Mãe Kuan Yin.
Francisco Pizarro,
invasor do reino Inca.
   No Peru, a chegada de Francisco Pizarro de pele clara, apontando no mar, trazendo seus navios cheios de cavalos, animais desconhecidos do nativo peruano, coincidiu  com a espera inca do deus Viracocha que voltaria com uma aparência diáfana para   resolver a crise civil alastrada pelo país pela desavença entre os irmãos Atahualpa e Huasca. Inicialmente, até que os incaicos se confrontassem com a crueldade e traições dos invasores espanhóis, os cabelos louros e a pele clara de Pizarro facilitou sua chegada e muito nativos  até fizeram sacrifícios em louvor ao deus que esperavam e que por fim viam chegar pelo mar .
   Ainda no Peru, Tupac Amarú foi o guerreiro mais amado do glorioso passado incaico.
   Segundo uma crença peruana, divulgada por guias turísticos, existiria no país ainda hoje uma aldeia montanhosa habitada por tecelãs tão tradicionais que se intitulam ainda de “adoradores do sol”. Em tal aldeia, se encontraria uma gigantesca tela bordada que tem como tema Tupac Amarú, ultimo resistente Inca. Trata-se de um trabalho em lã e penas do pássaro Colibri Dourado. Este, sendo um pássaro raríssimo de ser encontrado nas matas, dificulta terminar-se a tela que pretende atingir até os ombros um busto deste líder. Creem que ao terminarem a tela, Tupac Amarú, que fora decapitado pelos invasores em Cusco, renascerá. Sob a direção do reaparecimento deste guerreiro, a região peruana atingirá novamente o seu perdido e usurpado esplendor.

Em Cusco, comemoram o heroísmo de Tupac Amarú. 

   Estes mitos que expressam o desejo de perpetuarmos a vida de figuras importantes para as mudanças sociais da humanidade, na realidade expressam apenas desejos irrealizáveis. Porém, sem dívida , ao subestimarmos o valor dos mitos, certamente tocaríamos nas esperanças que vivem e alimentam o imaginário e o coração de muitos homens.