As visões espiritualistas
de linhas orientais nos apresentam uma
evolução que passa pelos reinos mineral, vegetal e animal antes de atingirem a
forma humana. Assim, também pensam linhas como os maçons, os rosacrucianos, os
martinistas e outros.
Tal crença é milenar e podemos encontra-la na
Antiguidade de vários povos. Em inúmeros museus, um imaginário de seres que atestam
este pensar, enriquecem suas coleções não deixando que o percamos. Também tapeceiros,
ceramistas, pintores contribuem para nos expor metamorfoses. Fabulosos seres em
transições formais são inúmeros e aqui tentarei apresentar alguns.
Centauro atirando a sua flecha. |
O
CENTAURO - Metade homem, metade cavalo, é encontrado nos mitos gregos.
Conta-nos Homero que tais seres híbridos usavam um discernimento e um
raciocínio já humano, mas entravam numa violência agressiva quando estavam
embriagados. A bebida afetava-lhes a consciência e sua parte animalesca, seus
instintos prevaleciam. O mito grego nos fala num centauro, o Quiron, cuja
evolução já estava tão próxima à humana que ele tornou-se o companheiro
constante do herói Aquiles, chegando a lhe ser um verdadeiro mestre.
Tal mito nos diz que ao morrer Quiron, Zeus, o
senhor do Olimpo, o transformou, por seus esforços, na linda constelação de
Centauro, que inspira o homem para o bem quando este a encara. No zodíaco, o
centauro é o signo de sagitário, mantendo sua forma híbrida e carregando uma
flecha direcionada ao céu. Segundo os estudos astrológicos, quem nasce sob a
sua influência, além da praticidade terrena, possui também uma busca por
transcendência, uma ânsia de ascender sempre.
O pássaro/alma "Bo" sobre um morto. |
O "BA" EGÍPCIO - Deste pássaro
minúsculo com face humana, encontraremos sua figura nas ruínas dos templos egípcios,
em pinturas murais e junto às cenas de embalsamentos. Para um egípcio antigo o
pássaro BA representava a alma do homem que na hora da morte fazia uma metamorfose
neste pássaro, porque, segundo suas crenças, ao morrermos, atingíamos uma
libertação. Nos libertaríamos de preconceitos e apegos que nos prendem. Ao
término de uma vida atingiríamos enfim, a liberdade de um ser alado.
Tritão assoprando sua concha. |
TRITÃO
– Um fabuloso híbrido, metade homem, metade peixe. No mito grego era filho de Netuno,
o deus do mar. Quando colocamos um caramujo nos ouvidos e ouvimos um ruído, um
zumbido contatamos uma marca deixada nele por Tritão. Segundo o mito, Tritão
soprava dentro dos caramujos, emitindo um som que alertava os marinheiros de obstáculos,
de perigosos rochedos que estivessem próximos a eles. Principalmente isto
acontecia no mar Egeu e no Mediterrâneo. Entre as criaturas das fábulas
marinhas Tritão é o protetor por excelência.
Sereia atraindo navegantes. |
AS
SEREIAS - Também as sereias são seres imaginários que povoam os mares. Mulheres
peixes da cintura abaixo. Formam uma dualidade de frigidez e fascinação. Sentem
desejos de atrair homens para um acasalamento. Porém, não conseguem tal intento,
pois não contam com órgãos genitais femininos e são da cintura abaixo frigidas como
o são os peixes. Contudo, são imensamente sedutoras. Seu recurso de atração é o
canto. Cantam muito sobre os rochedos para atrair homens.
Lembremos
que na epopeia homérica da Odisseia, Ulisses precisou amarrar-se ao mastro de
seu barco para fugir a atração enganosa do canto das sereias. Estas, ele o
sabia bem, não lhe dariam prazeres sensuais e apenas o afundariam no oceano.
O folclore brasileiro conta também com uma
sereia, Iara, que vive nos rios amazônicos. É perversa. Atrai os incautos
homens e depois os afoga no rio. Diz o mito que o homem que escuta Iara
enlouquece. Seus familiares costumam então afasta-los das cachoeiras, riachos e
fontes, pois o homem obcecado por Iara a procura em todos estes lugares.
O
único odor capaz de afastar Iara é o do alho. Então, ainda hoje, o homem
crédulo da Amazônia que necessita anoitecer na pesca, esfrega alho no corpo
para evitar sua sedução.
O culto Afro nos legou a crença em Iemanjá,
porém não existe nela a perversidade de Iara. Também metade mulher, metade
peixe, ela, vaidosa, só requer de seus adoradores adereços, colônias cheirosas,
espelhos e pentes que são atirados então no mar em seu dia.
No
sincretismo com Nossa Senhora das Candeias ela é a bondosa Mãe D’água
possuidora de grande instinto materno que protege os pescadores dos perigos do
mar. Estes, gratos a reverenciam com a Saudação afro: “Ado Iya”.
A mítica imagem do lobisomen. |
O
LOBISOMEM - Numa inversão ao processo evolutivo do animal para o homem, temos o
mito do lobisomem. Nele, o homem se transforma em lobo. O grego antigo
acreditava tanto nesta metamorfose que passou a estudar uma doença mental que
intitulou de Licantropia. Esta levava o homem à profunda depressão e isolamento
até sua transformação em um lobo.
No norte e nordeste do nosso país, esta
crença é ainda mantida. Nela, é dito que o sétimo filho de um mesmo sexo
nascido de um casal, tem a tendência de tornar-se um lobisomem. Ainda mais: diz
ela que a lua cheia auxilia este tipo de metamorfose.
Bacanal com a presença de um sátiro. |
SÁTIROS
- Metade homem, metade bode. Tais híbridos influenciam os comportamentos
sexuais animalescos nos seres humanos. Faziam-se presentes nos bacanais gregos
e romanos do deus Baco. Provocavam nas mulheres do cortejo de Baco, as
bacantes, instintos sensuais muito primitivos. Apareciam esses híbridos também
nos Sabats medievais com a conotação de seduzir mulheres. Nos processos contra bruxarias,
inúmeras mulheres, acusadas de manterem relações com estes seres caprinos,
foram queimadas em fogueiras.
A
ORIGEM DO POVO HELENÍSTICO - O melhor exemplo da metamorfose de um ser vindo de
um minério para o ser humano, nós encontramos na formação deste povo grego.
Conta-se que o único casal que sobreviveu ao dilúvio grego, Decalião e Pirra,
sozinhos e desesperados, pediram à deusa Diana que lhes desse uma nova
humanidade para ajuda-los. A deusa então lhes disse que pegassem os ossos de
sua mãe e tirassem por trás de seus ombros. Porem, a única mãe que agora
possuíam era a Mãe Terra. Compreenderam então que seus ossos eram as suas
pedras. Passaram a pega-las e as lançavam. Então, a umidade das águas do
dilúvio criou sobre elas musgos que logo se tornavam em carne. Também, no céu
apareceu o deus solar Apolo, que com os seus raios iluminadores deram aqueles
novos seres, em transformação, a consciência iluminada dos homens. Assim foi
como Decalião e Pirra viram surgir diante deles a civilização muito sábia dos Helenistas.