Na velhice, perdas nos são
acumuladas. Já desapareceram de nosso convívio parentes e amigos amados. Por
nosso estado de fragilidade, renunciamos à visitas e conhecimentos de novos
belos locais. Uma perda, por certo. Além disso, nossa total autonomia se vai,
quando já filhos ou auxiliares nos são necessários para vencermos o mínimo de
nosso cotidiano: Galgarmos pequenos obstáculos tais como uma rua íngreme ou uma
simples escada.
O florescer da sabedoria. |
Porém, a compensação a tudo isto nos vem
como dádiva, quando da velhice nos chega seu mais precioso ganho: A
interiorização. Estarmos a sós com os
nossos pensares se torna algo incalculavelmente prazeroso. As lembranças
felizes do que bem plantamos resultam em alegrias de uma farta colheita; os
momentos dolorosos que nos atingiram nos chegam amenizados, compreendidos, sem
a violência que no passado causaram. Contudo, tal interiorização não significa
um alheamento ao mundo externo. Muitos pensam erroneamente, que a velhice anula
o entusiasmo pelo que nos cerca, que causa uma espécie de indiferença.
Tais pensamentos se contrapõem à minha
própria verdade. O que realmente senti mudar em mim, nos tantos anos já
decorridos, foi a maneira de enxergar coisas, ambientes e principalmente pessoas. Ultrapassa-se na velhice aquele primeiro
estágio de ver o mundo como se o estivéssemos conhecendo apenas na superfície, por
suas formas aparentes, externas. Ultrapassa-se também aquela visão que
racionaliza pessoas e coisas, as critica ou elogia, segundo a cultura em que
estamos inseridos. Deixa-se para trás especulações racionais e se vai, além
disso. Alcança-se um ver que desnuda
apenas aquilo que cada pessoa traz em si, sem distinções: O desejo de
felicidade. Pressente-se com mais facilidade o estado íntimo de alguém. Ama-se
mais quem já sempre se amou. Passa-se a amar a quem nos era indiferente.
Nas cores da natureza quer se adivinhar o
artista oculto que a pintou. E, num maior deslumbramento interno, acabamos por
nos identificar a Ele. A natureza torna-se então mais esplêndida, porque é mais
intensamente percebida.
Nossas manifestações externas não sendo tão
exuberantes, pelas limitações pertinentes à velhice adquiriu, enfim, como
ganho, o surpreendente reforço de um sentir mais pleno.