Os religiosos antigos aproveitavam a
sensibilidade feminina para acalmar e agradecer os deuses. E, poucos povos o
fizeram com tanta persistência como o povo Inca.
“Em todas as cidades do Tahuantinsuyo (o
império Inca dos quatro cantos) havia os santuários chamados “Casas das
Escolhidas”,” “Casas das Virgens do Sol”, (Aquillawasi) onde residiam as
Aqllas.
Estas chegavam ali meninas, a partir de
tenra idade, até com apenas 10 anos, escolhidas a serem preparadas para
consagrar suas vidas ao deus solar Inti (do qual os primeiros habitantes de
Cusco acreditam descender), ao deus Viracocha e ao soberano Inca.
Eram selecionadas a partir de sua origem
social, que as encaminhariam a função que exerceriam e principalmente por suas
excepcionais qualidades físicas e morais. Moças belíssimas e de grande retidão.
Seu número era imenso. Só Cusco, cidade sagrada, umbigo do mundo Inca, contava
com 1500 Aqllas. Eram respeitadas porque
consagradas ao deus Inti e (assim nos afirma Victor Angles Vargas em sua
“História do Cusco Incaico”) mesmo o seu serviço ao soberano era “apenas para
confeccionar trajes, acessórios e adornos para a família imperial”, nada se entendendo
então que deveriam servir o soberano em relações íntimas. Vargas discorda de escritores,
quando estes dizem que os soberanos faziam com elas um harém. Pensa, ao
contrario, que elas não seriam tocadas sexualmente , porque pelas crenças
incaicas eram respeitadas e até temidas como “ Esposas do Sol.”
Sua castidade era rigorosa. O grande
complexo arquitetônico da “Casa das Escolhidas!”, na praça central de Cusco,
que depois, na invasão espanhola, foi
ocupado , em parte, pelo Convento de
Santa Catarina, com interiores que eram
na época incaica revestidos de placas de
ouro, tinha suas portas fortemente guardadas. Mesmo os homens servidores que
mantinham a limpeza e conservação das “Casas” eram castrados e não era incomum serem
mutilados no nariz e orelha para não pareceram atraentes aos olhos das Aqllas.
Caso se desse algum relacionamento que
resultasse em gravidez, a Escolhida seria enterrada viva, seu bebê sacrificado
em holocausto a Inti e o seu par torturado.
Não se compreenda, contudo que nestes
santuários as escolhidas viviam apenas para orações e cultos. Eles eram centros
culturais e artísticos, onde as Aqllas se dedicavam a atividades diversas.
Eram exímias dançarinas, cantoras,
artistas e habilidosas tecelãs que teciam vestimentas riquíssimas com que a
nobreza se apresentava em dias solenes; plantadoras de flores que enfeitavam as
ruas da cidade nos Solstícios.
No IntiRaymi (festa do sol), mostravam sua
habilidade culinária e só as suas mãos consagradas podiam fazer os deliciosos Sankhu
(pães de milho) de grande simbolismo litúrgico, para que distribuídos entre a
população a fizesse comungar com as riquezas da Pachamama (mãe terra) e também
a bebida Chicha que em jarro de ouro seria oferecida ao imperador, que após bebê-la,
faria a Ablução. Quando –assim pensavam- a mãe terra recebesse e bebesse também
parte da gostosa Chicha, feita pelas Aqllas, ela ficaria contentada ao ver o
que era possível fazer-se com as suas doações.
Porém, entre as escolhidas havia aquelas
Virgens, já consagradas, mas não ainda Esposas do Sol, casadouras, que podiam
ser dadas em matrimônio a chefes guerreiros que houvessem feito façanhas
notáveis que as merecessem ou a chefes de províncias vizinhas, cujo casamento
proporcionaria união política com Cusco.
Do santuário de Machu Picchu é dito que
suas Aqllas se diferenciavam das demais, pois tais como as antigas pitonisas
gregas, dedicavam-se a adivinhações e oráculos e eram também feiticeiras, o que
marcaria Machu Picchu como local propenso a bruxarias. Teriam sido estas Aqllas
que em 1532 durante as lutas entre os dois irmãos imperadores Atahuallpa e
Huáscar, teriam conseguido fugir para região do Wilcabamba que se manteve
depois como o último baluarte ante os invasores espanhóis até 1572, ,quando finalmente,
com a resistência vencida, as Aqllas de todos os santuários foram naturalmente
mortas.
As “Virgens do Sol” e suas famosas
Mamacunas, mulheres de grande saber espiritual e artístico que as conduziam,
são hoje apenas lembranças históricas que vivem como uma saudade , naqueles
modernos peruanos que cultuam tanto as suas origens.