quinta-feira, 14 de agosto de 2014

A Itália em sua Origem Mítica



      Enéias é o único dos grandes guerreiros troianos a escapar com vida da mitológica Guerra de Troia.
     Herói semideus, pois é filho de Afrodite, será o personagem central da epopeia Eneida, escrita por Virgílio, maior poeta do mundo romano do 1º século antes de Cristo, é o símbolo da continuidade das gerações. Deixa Troia incendiada, com seu pai velhinho, seu filho pequeno Ascânio, levando nas mãos um Penate. Penate, um gênio protetor da alma da pátria, da família, do Estado, que os protegerá e a seu pequeno grupo de companheiros, numa frota, na longa jornada que irá empreender pelo mar para formar o país que hoje conhecemos como Itália. Esta saída, temos magistralmente representada na escultura do renascentista Bernine.
 
Troia incendiada.
 
     Diz-nos Virgílio em sua Eneida (12 cantos): “Foge, filho da deusa, escapa destas chamas, já fizestes bastante pela pátria e por Príamo, seu rei. Troia recomenda-te seus objetos sagrados, seus Penates. Toma-os como protetores de teu destino, procura para eles outras muralhas que construirás depois de teres vagado sem rumo pelo mar”.
     Desesperado por largar sua terra e a esposa que morrera em Troia, a vê aparecer em uma visão e lhe afirmar que os seus descendentes viveriam e reduziriam todas as nações a seu jugo.
    Juno, esposa de Zeus, no entanto, resolve matar esta esperança dos troianos em fuga. Vai para Eólia, o pais dos ventos, e suplica ao deus dos ventos para fazer naufragar os navios de Eneias e seus companheiros, dando-lhe como recompensa doze lindas Ninfas.
    Quando os ventos furiosos balançam as velas e quebram os remos estabelece-se o pânico. Três navios são despedaçados sobre os rochedos. Netuno, o deus do mar, porém irrita-se com aquela invasão em seu império marítimo, vem à superfície e acalma as águas revoltas. Com a mesma força com que ele perseguirá Ulisses que teve a ousadia de com seu cavalo de madeira derrubar a muralha que ele, o deus, havia dado à Troia, agora, ele protegerá Enéias, uma das vítimas daquele estratagema de Ulisses.
    Contudo, será sempre Zeus, o grande senhor do Olimpo, quem terá a última palavra. Aparecerá em sonho a Enéias e lhe ordenará tomar o compromisso de buscar uma terra de nome Hespéria para ali formar uma raça.
    Todos os sofrimentos e peripécias vividas no mar são por Enéias esquecidos, quando ele aporta em Cartago e ali se apaixona por sua rainha Dido. Vive ali vários anos de uma intensa paixão, até que Zeus lhe aparece para lhe lembrar do compromisso assumido. Enéias larga então a amada por obediência a Zeus. Esta, vendo desaparecer na linha do horizonte a embarcação que o levava, mata-se na beira da praia, numa das grandes cenas trágicas da Eneida.

Enéias fugindo de Troia carregando o pai e o filho.
 
    Chegando ao território da Hespéria (antiga Itália) Enéias, muito saudoso de seu velho pai que morrera na viagem, vai à Cumas procurar a “Sibila de Cumas”. Quer que ela o leve ao reino dos mortos. Esta era a mais famosa das pitonisas.  Com inigualáveis poderes, previu com minúcias os destinos do Império Romano, que constam nos famosos “Livros Sibilinos”, guardados no templo de Júpiter Capitolino.  Virgílio, em sua epopeia nos conta como são as regiões infernais e os campos Elíseos do reino dos mortos. Mais do que nos relatos homéricos vão ali surgir as ideias de reencarnações influenciadas pelos intercâmbios com o oriente dos tempos de Virgílio. A Sibila de Cumes mostra a Enéias os indivíduos que irão nascer na raça que ele criará, e lhe mostra o rio Lete, onde as almas beberão o esquecimento das vidas passadas, antes de nascerem na futura Roma. Hoje, esta conhecida Sibila aparece retratada nos magníficos afrescos de Miguel Ângelo, na Capela Sistina do Vaticano.
    Chegando finalmente em suas proximidades, encontrou o chefe de uma tribo de nome Latino (que daria nome a futura raça). Pai de uma jovem de nome Lavínia, num sonho, Latino havia sido advertido pelos deuses que guardasse sua filha para um estrangeiro que formaria com ela uma raça que dominaria o mundo.
   Casando-se com Lavínia, Enéias conta entre seus descendentes uma Vestal de nome
Réa Silvia por quem o deus Marte se apaixonara. Desta ligação nasceram dois gêmeos: Rômulo e Remo.  As Vestais eram sacerdotisas da deusa Vesta, guardadoras do fogo sagrado que protegia o local onde hoje é Roma. Obedeciam a um rigoroso voto de castidade e eram punidas com a morte se o transgredissem.
 
A loba romana amamentando Rômulo e Remo.
 

    Quando Réia Silvia, virgem casta, aparece grávida, um tio seu leva os gêmeos que lhe nasceram para um monte e ali os abandonou. O deus Marte, no entanto, preserva a vida de seus filhos mandando uma loba para alimenta-los. Crescendo com o sangue do deus da guerra Marte, Rômulo e Remo lutam depois entre si pelo lugar onde construiriam Roma. Rômulo acaba por matar seu irmão e funda a cidade.
    Falta-lhe contudo mulheres para procriar filhos que viessem habitá-la. Invade então uma cidade vizinha e lá rouba as suas mulheres. Episódio este conhecido na História como “O Roubo das Sabinas”. Fundada por um filho do deus da guerra, Marte, Roma nasce sob a égide da violência. Torna-se um dos povos mais conquistadores, violento e invasor da Antiguidade.
 

quarta-feira, 30 de julho de 2014

O Desenvolvimento das Religiões e suas Caracterísitcas

Religiões Antigas

Passamos nos primórdios de épocas remotas, muito arcaicas pelos cultos das deusas do Matriarcado, sendo estas depois superadas pelos deuses do Patriarcado, que aparecem na mitologia dos vários povos.
   Mais tarde, passamos ao Monoteísmo, crença em um Deus único, com sua origem no Egito há 14.000 anos antes de nossa época, com o faraó Akenaton. Porém, este culto ao deus Aton, foi abandonado após a morte deste faraó e só reavivado depois pelo Bramanismo com culto à Brahma, pelo Judaísmo pelo culto a Javé e pelo Zoroastrismo, na Pérsia (atual Irã) com o culto a Ahura Mazda.

Akenaton, o faraó monoteísta.

   Assim, estas três religiões: Bramanismo, Judaísmo e Zoroastrismo são consideradas as mais antigas religiões monoteístas da História. Também do período anterior ao Cristo (sem, contudo contar com um Deus criador como Brahma) encontramos no Japão o Xintoísmo, na Índia o Budismo e na China o Taoismo.
   Vamos então nos deter em algumas características destas religiões da Antiguidade.
   O Bramanismo tem como princípio supremo do universo o Brama e como princípio vital dos seres (a centelha divina em nós) o Atman. Baseia-se  em dois livros sagrados; “Ao Brâmanes” e os “ Upanishadas”. O primeiro trata da evolução pela sabedoria e o segundo pela devoção(a união com o Absoluto). Nasceu da ideia de cultos celebrados e dirigidos por sacerdotes que substituíram o trabalho por transes dos xamãs tribais.
   Com a imensa autoridade que conseguiram, deram início ao sistema de castas o que maculou os seus ensinamentos mais profundos (sobre o Brama e o Atma).
   O judaísmo é dividido em quatro períodos:  Religião dos Patriarcas onde se destaca a figura de Abraão, para quem Jeová promete ao povo Judeu a terra de Canaã, a Palestina. Vem depois a religião de Moisés onde, segundo os judeus é escrito a Torá, o livro sagrado do Judaísmo. Segue-se o período dos Profetas( Daniel, Ezequiel, Jeremias etc) por ocasião em que os Judeus foram exilados na Babilônia. Foi durante este exílio, no Séc.VII AC, que surgiram as ideias esotéricas que fazendo  oposição ao ortodoxia judaica  seguidora apenas da Torá, deram origem à Cabala.
 O último período é o Pós-exílio. Nele, o poder religioso e administrativo de toda a Judeia fica nas mãos dos sacerdotes do Sínodo Judaico, cuja sede era o templo de Jerusalém com obediência rigorosa à Torá mosaica, bíblia do Velho Testamento, com o desaparecimento quase total da Cabala, que irá renascer na Idade Média. Do templo de Jerusalém, hoje só resta o famoso “ Muro das Lamentações”. Nele, os judeus lamentam a perda de seus reis sábios e poetas como Salomão e Davi.

Abraão, patriarca hebraico oferecendo
seu filho em holocausto.

   Quanto ao Zoroastrismo, foi Zoroastro quem transformou o Politeísmo persa no Monoteísmo
cujo deus único é Mazda. Tinha como principal culto, o fogo. Religião dualista onde o Bem, Mazda e o Mal Alruman estão sempre em conflito dentro dos homens. O Zoroastrismo decaiu e desapareceu no Séc.VII de nossa época na Pérsia ,quando o Islamismo se apossou do país.
Hoje o Zoroastrismo é encontrado apenas na Índia nos grupos denominados “Parsis” que fugiram para a Índia pela invasão muçulmana.
   Quanto ao Xintoísmo , é a religião do Japão, de origem remota, talvez vinda de épocas tribais, cuja maior característica era o culto aos ancestrais  aos mais velhos que eram nas tribos os senhores da experiência.  Porém, quando no Séc.VI AC o Budismo entrou no Japão, o Xintoísmo perdeu sua intensidade. Contudo, no Séc IXX, aconteceu  uma onda de nacionalismo no Japão e apesar do Budismo ter se tornado muito forte ali, foi revivido um Xintoísmo de Estado, com culto à pessoa do imperador. O imperador –segundo creem- é a representação da deusa solar Amateruzu. O cetro de seu poder  foi lhe atribuído pela deusa, para que ele tivesse sob suas ordens  as ilhas  japonesas. Sendo que o Japão é orgulhosamente considerado  pelos japoneses como um país de deuses , uma vez que a raça que nele habita é, pelo mito, de  origem divina descendente de uma deusa.Por razão desta crença, o culto ao imperador se mantêm como forma de Estado.
   Em respeito ao Budismo, este surgiu no Séc.VI antes de nossa era, como uma reação ao sistema  de castas do Bramanismo e de sua autoridade opressora.  Diferencia–se sobremaneira do Bramanismo porque não se dedica à Metafísica, isto é, não faz conjecturas sobre o universo, cadeias planetárias  e a trajetória evolutiva do homem em relação ao cosmos, ao seu Atman ou  mesmo ao  Brama criador. Sua única preocupação é a dor humana; em vencermos a dor.  Esta doutrina baseia-se nas “ Quatro Nobres Verdades” versando todas elas no sofrimento, conduzindo o crente por meio do “ Caminho Óctuplo” aos degraus  pelos quais vencerá a dor.

Um santuário xintoísta.

   Entre perseguições, o Budismo sobreviveu na Índia por mais de mil anos e no Séc.VIII da  era cristã saiu da Índia, espalhando-se em várias regiões da Ásia.  Seu mais conhecido iluminado é  o Buda Gautama também chamado Buda Sakiamuni . É uma religião com uma variedade de escolas ,sistemas e ramos que estudam em profundidade a psicologia humana. Todas se igualando no culto a este Buda.
   Hoje,  no Brasil, chegou a nós com maior  força o Budismo Tibetano, sistema búdico chamado  Lamaísmo , dirigido por instrutores Lamas sob o comando espiritual de um Dalai Lama (mestre grande como o oceano) seguidor este da escola Mahayana,  que vê na compaixão a única forma de evolução.
   Já o Taoismo é uma religião chinesa , fundada pelo  grande pensador chinês Lao Tse. Seu livro mais  famoso é o Tao Te Ching (o livro do Caminho e da Verdade) constituído por 81 aforismos (sentenças breves, morais e espirituais). É uma tradição iniciática que se transmite de mestre a discípulo.
 Tao significa O Caminho. Tudo obedece a um caminho, uma estrela ,um planeta, um rio. Tudo segue o seu próprio curso. È a ordem universal. Só o homem, por seu livre arbítrio, cria o caos  no qual se enreda. É a religião da modéstia. Nada fazer para sobressair-se é o seu lema. O culto a Deus ,tal como o ocidental o concebe não existe no Taoismo. O Tao, o Caminho, constitui por si a essência do universo,  a realidade última. O tão é a energia que flui através de toda a vida. Do Tao deriva-se o Yin e o Yang, a natureza dual de todas as coisas. Tudo enfim que vemos, o céu ,a terra, a humanidade, nasceu da energia do Tao.

Comentários sobre estas religiões

   Talvez seja o Bramanismo aquela religião que nos deu a base para desenvolvermos o sentimento religioso: A ligação com o Absoluto ,por sua crença no Brama criador, e a descoberta do Atma, o nosso eu superior, a centelha deste mesmo Deus em cada um de nós, centelha dentro da qual vivemos e temos o nosso ser.
    O judaísmo nos deixou os magníficos ensinamentos da Cabala ,onde pelo esquema da chamada Arvore da Vida, nos são apresentadas emanações divinas, que vamos assimilando através de símbolos num sistema  onde a cada vez que passamos novamente pela mesma emanação(caminhos e esferas)  a assimilamos por um prisma mais evoluído, assim nos inteirando pouco a pouco da Verdade buscada.

Lao Tsé idealizador da doutrina taoísta.


   No Zoroastrismo religião dual vemos aquilo que temos de equilibrar: nossas duas vozes internas simbolizadas nele por Mazda e Aruhman, o bem e o mal, nos requerendo discernimento como principal passo no evoluir .
   Já o Xintoísmo nos leva, com seu culto aos ancestrais,  a valorizar a  unicidade entre os seres, tudo o que devemos em corpo, mente e emoções a centenas de seres humanos  que nos antecederam ,aos que nos cercam . Com as leis divinas nos proporcionando isto através do recurso de genes doados e contatos familiares, valorizamos o respeito ao grupo familiar.
   Do Budismo recebemos também uma lição valiosa: Nós criamos nossas próprias dores. A solução delas está em nos modificarmos, e, com aquela sabedoria e objetividade peculiar ao budismo, ele nos dá uma listagem de comportamentos que nos auxiliam nesta modificação: O seu Caminho Óctuplo.

   O Taoismo nos lembra de que temos cada um de nós um papel no universo. Cada um, com um caminho a seguir.  Descobrir qual é o nosso curso ,qual o nosso papel junto a amigos, familiares e pessoas com as quais privamos em geral, é o nosso exercício principal.

sábado, 10 de maio de 2014

Duas Lendas Sobre o Mundo Angélico


Uma lenda da Irlanda nos conta que na época do paraíso do Éden, Eva estava lavando roupa na beira de um riacho quando javé lhe apareceu. Assustada, ela escondeu dele os filhos que ainda não havia lavado e Javé então lhe perguntou :Estão aqui todos os seus filhos? Ela disse: sim estão todos. Com javé percebeu sua mentira, advertiu Eva que todos aqueles que ela havia escondido ficariam para sempre invisíveis, escondidos aos olhos dos homens. Estes filhos invisíveis transformaram-se em elfos, fadas, seres da natureza.


Oisin e seu cavalo.


   Outra lenda, esta dos celtas pagãos irlandeses, nos fala sobre o tempo dos homens onde estes envelhecem e o tempo dos anjos e dos seres da natureza que possuem a juventude eterna. É a história de Oisin. Este era um guerreiro celta da tribo dos Fianna.  Desejou sempre transpassa o limite que o separava da terra da eterna juventude, onde vivia o povo angélico. Conseguiu chegar lá e ali viveu feliz e naturalmente jovem por muito tempo. Um dia porém  sentiu grande saudade da sua terra, a Irlanda, desejou muito saber como estariam os companheiros Fianna. Foi, porém advertido pelos habitantes angélicos de que não voltasse lá, pois ali encontraria a velhice e a decrepitude. Oisin, contudo não resistiu ao desejo e voltou. Os anjos então lhe deram um cavalo branco e o aconselharam a jamais desmontá-lo, pois o cavalo era a sua ligação à terra da eterna juventude. Quando chegou lá, não encontrou mais sua tribo  porque o Cristianismo já reinava ali.
   Enquanto passeava em seu cavalo, visitando os locais queridos onde havia cantado, dançado, feito belos ritos pagãos e ouvido inesquecíveis histórias, viu um grupo de cristãos tentando erguer uma igreja, mas sem força de erguer as pedras do alicerce. Ele , que já fora um guerreiro e possuía até ali , após tantos e tantos anos, ainda a mesma força de sua juventude, aproximou-se para ajudá-los. Mas como não queria descer do cavalo, conforme lhe fora aconselhado, tirou o pé do estribo e enfiou o pé por baixo de cada pedra. Porém, num dado momento a cilha arrebentou e quando a sela virou ele foi arremessado ao chão.
   Quando Oisin tocou com o corpo na terra irlandesa, transformou-se repentinamente num velho encarquilhado, decrépito e frágil em acordo aos tantos anos que já vivera.
   Oisin perdera a juventude eterna e compreendeu que o tempo na terra dos homens era contado e na terra dos anjos não se contava.  Razão porque os anjos e seres da natureza mantinham seus corpos sempre jovens.
 

A Filosofia do Budismo e Diferenças ao Hinduísmo


O Budismo irá se diferenciar do Hinduísmo, pois enquanto este crê no Brahman, no Deus criador, o Budismo não crê em Deus, nem em nossa alma individual. Para o Budismo, nossa consciência mais alta é a mente. O que é a mente?  É a parte do ser baseada em experiências, conhecimentos, pensamentos, parte sem forma que sobrevive à morte. O que sobrevive no Budismo?  Não é o Atma, a alma ligada ao Brahman, mas a corrente mental de cada um de nós, com impressões deixadas nela por nossas ações boas ou más. Esta corrente mental, quando é negativa, dá origem à nova experiência de vida, às reencarnações. Então, reencarnamos porque temos carma, isto é, marcas negativas em nossa mente. Quando alguém não tem mais impressões negativas na corrente mental, não se encarna mais. Liberta-se do Samsara (ciclos encarnatórios) a não ser em casos especiais, como veremos depois. Quando nossa consciência não possui mais marcas insatisfatórias, ela entra num estado de bemaventurança chamado Nirvana. Ao contrário do Hinduísmo que em meditação busca ultrapassar a mente, o budista ao meditar quer acalmar a mente para atingir a bemaventurança da mente búdica. Enquanto o Hinduísta preocupa-se com o universo em que fazemos nossa evolução, cadeias planetárias, nossa eras evolutivas, raças etc (Teorias encontradas na escola teosófica de Blavastky e em outras tantas), o Budismo dedica-se apenas em atingirmos a felicidade, nos livrarmos de nossas dores e sofrimentos. É chamado  por isso “A doutrina da dor”.Nos livrarmos de nossos medos raivas e apegos, esta é também a meta. Naturalmente, assim, todos nós, segundo o Budismo, nos tornaremos Budas. Teremos uma mente plena de bemaventurança, porém, jamais seremos um ser individual. O que é um ser individual? Um ser que tem características próprias.  O Budismo não endossa o pensamento pitagórico de que cada um de nós é um número dentro do grande esquema matemático do universo, nem que sejamos uma nota, um som, dentro do que chamava “a Música das Esferas”.  Tampouco endossa o pensamento maçônico de que cada um de nós é um tijolinho dentro da construção do grande “Arquiteto do Universo”. No Budismo, todos aqueles que atingem a mente búdica têm as mesmas percepções espirituais, suas mentes são idênticas. Formam uma Unidade, não uma Diversidade na Unidade, como pensam os hinduístas. Os budistas quando rezam, não o fazem a Deus, mas a seres iluminados e compassivos.

Buda e seus cinco primeiros discípulos.


     A mais antiga das tradições budistas é o Hinayana também chamado de Theravada. Um adepto do Theravada acha que se cada homem melhora o mundo automaticamente melhora. Então, é completamente voltado a si mesmo, através de práticas rigorosas. Persegue o ideal de chegar a ser um Arhat, um ser perfeito. Não perturba o mundo, mas também não se envolve em suas misérias e erros. Deixa que cada um siga o seu caminho.

     No séc. I da nossa era surge a escola Mahayana com grande ênfase na crença em Bodhisattvas. Estes, seres de mente já purificada, mas que sacrificam-se retornando à encarnações, apenas para ajudarem à humanidade a se livrarem de seus erros. Seu princípio é a Compaixão. No Mahayana, não só monges, mas também leigos podem chegar à mente nirvânica apenas trilhando o caminho da Compaixão.

     Temos o grande exemplo de Compaixão no Dalai Lama tibetano Tensin Giatso que embora tendo perdido trono e país, sem qualquer demonstração de mágoa, segue sempre risonho a pregar pelo mundo o Caminho Mahayana da Compaixão. O nome Dalai Lama quer dizer : “mestre grande como o oceano”.  O Mahayana tibetano foi enriquecido pelo Lamaísmo dirigido por mestres, seus Lamas e Riponchês. Utilizam liturgias, mantrans, mandalas e mudras como recursos de entendimento para seus discípulos.

Lótus, a flor sagrada do Budismo.


      Os principais preceitos do Budismo Mahayana são: A Transitoriedade Das Coisas (que nos leva ao desapego) e a Teoria do Vazio.

      O Vazio trata da forma errônea como vemos a nós e as pessoas. Quando observamos alguém ou alguma coisa nunca nos lembramos de que seus atos fora abastecidos por circunstâncias anteriores ou presentes, uma cultura, um meio geográfico, uma ocasião, ou alguém. Que aqui no mundo físico, sempre temos uma existência compartilhada com o restante do mundo, dependente dele. Por exemplo: Quando observamos uma árvore, ela nos parece tal como a vê, porque está inserida em determinado ambiente que lhe dá muito ou pouco sol, muita ou pouca água, cuidados ou não. Se recebesse outras influências, talvez seu tamanho fosse diferente, também sua cor. Até uma coisa concreta tem vida compartilhada. Se dizemos: Esta mesa é boa, é durável. Ela é assim porque a madeira que a estruturou era boa. Nada é desassociado de nada, tudo é dependente.

     O que quer o Mahayana com a teoria do Vazio?  Com a visão da vida compartilhada, compreendemos e perdoamos mais as pessoas, pois as sabemos resultado de muitas influências, não as vemos isoladas do todo. Também nos livramos de nossos orgulhos e vaidades, porque tudo o que nos orgulhamos de ser recebeu o auxílio de outrem. Os próprios ensinamentos religiosos que assimilamos , embora  apresentando conceitos diversos, foram compartilhados, dependentes uns dos outros. Assim, vemos o Islã surgindo de antigas  ideias cristãs, o Cristianismo surgindo do Judaísmo, o Budismo surgindo das ideias reencarnacionistas do Bramanismo. O monoteísmo judaico surgindo de ideias egípcias.

Kwan Yin, Bodhisattva da compaixão.


 A meditação Mahayana conta com dois tipos básicos: A Enstática e a Estática. A primeira busca um estado de equilíbrio que em que se espera cessar todo o processo sensorial. Nada a ser visualizado. Na segunda, é exigida uma imagem visual ou projeção mental, geralmente voltada para o chamado "Campo do Buda", isto é, o conjunto de seus representantes, de seres compassivos. São dadas visões belas que psicologicamente nos trazem imensos benefícios e transformações. Habitualmente chamamos estas meditações de "Induzidas". Uma imagem que naturalmente nos favorece é a de Kuan Yin a grande Bodhisattva da compaixão.
 

sábado, 15 de março de 2014

Yewa - A Lua


    Entre as muitas tentativas de neutralizar a força do patriarcado que oprimia a mulher, os nagôs nos dão o mito de Yewa , a lua.

    Quando da criação do mundo pelos orixás, ela foi uma das poucas deusas que permaneceram no paradisíaco céu de Olurum. No entanto, quando soube que o adivinho Orumilá era um dos principais defensores da supremacia masculina, resolveu descer ao mundo dos homens para vingar-se dele.
 
As duas faces de Yewa.

   
Era muito bela. Mesmo Omulú, orixá que jamais levantava o rosto do chão, porque o tinha mutilado pela lepra e que por isto nunca vira no alto o firmamento, Yewa brilhando radiosa entre as estrelas, apaixonou-se por ela, somente a vendo refletida numa poça de água.

    A beleza desta deusa era tanta que apenas o seu reflexo já deixava os homens românticos e enamorados. Disso ela iria se aproveitar para seduzir e castigar o adivinho Orumilá.

    Yewa era a deusa que mais manifestava a dualidade do caráter feminino. Ocultava sempre uma face. Se por um lado era doce, maternal, sedutora, por outro sabia ser de uma sutileza maliciosa e cruel.  Então, quando desceu à terra, sua manifestação física tinha como ela duas faces. À noite, Yewa era a deusa da beleza irresistível, mas durante o dia apresentava-se como uma bruxa horrível e peçonhenta.

    Quando seduziu Orumilá levou-o à uma cabana na floresta onde ele, isolado, ficou à sua mercê. À noite, entregava-se apaixonadamente a todos os prazeres que o belo corpo da deusa lhe dava. Porém, quando prostrava-se dormindo saciado, ela, que começava a mostrar seu outro lado, envolvia-o em ervas mágicas que o deixavam durante todo o dia adormecido, afastado de suas prestigiadas tarefas adivinhatórias. Orumilá permaneceu durante tempos tal como Yewa desejava. Absolutamente apenas submisso a ela.

Brilho lunar, um reflexo do poder solar.

    Contudo, conta o mito, que Exú e quem nada se esconde pois tem o dom da ambivalência, viu a situação crítica de Orumilá e foi em seu socorro. Quando, numa manhã Yewa deixou Orumilá adormecido na cabana e saiu até as margens de um rio, já então em sua diabólica aparência de bruxa, Exu acordou Orumilá e levou-o até ela para mostrar-lhe sua outra face.

    O mito se encerra quando Orumilá, em desespero, a mata. Yewa retorna então ao céu como a lua que é. Porém, seu projeto de acabar com a opressão patriarcal frustrou-se. Yewa tornou-se um astro morto pois Orumilá a matara. Ficou na dependência do poder masculino do sol para ter brilho. Só com o seu auxílio, sua face de beleza pode inspirar sonhos de amor nos poetas e nos namorados. È também obrigada a esconder sempre, para quem está no mundo, o seu lado feio, colocando uma véu negro sobre ela.

Paimpont, a Floresta Encantada

   No coração da Bretanha francesa lá está um ponto emocionante de uma caminhada iniciática. Paimpont, a antiga Brocellande, floresta preferida pelos cavalheiros do rei Artur. Ali o sagrado Graal, perdido nela por José de Arimathéa, o seguidor do Cristo, era buscado.


Carvalho, árvore sagrada dos druidas em Paimpont.

Tudo em Paimpont nos leva as lembranças das lendas arturianas. Ali-afirma-se era o refúgio dos amores da feiticeira Viviane, e de Merlin o maior dos magos druidas. Tendo perdido sua iniciação pela paixão à Viviane, que o prendeu em um círculo mágico na própria floresta, Merlin, conta a lenda, veio a morrer, deixando para todos os místicos que ali chegam a pedra rústica que cobre o seu túmulo. São surpreendentes as devoções constantes ainda hoje feita pelos franceses modernos no local.

    Ao antigo druida uma árvore com sua raiz, seu tronco e suas galhadas representavam respectivamente o mundo subterrâneo, o mundo humano e o divino. Que se diria então para Brocellande com seus 7.000 ha de plantios de carvalho, a árvore sagrada por excelência? Para Brocellande todas as homenagens eram poucas. Foi ela o grande objeto de cultos dirigidos á natureza, local das fogueiras de Beltane acesas em honra ao deus solar Bellenos, e do recolhimento do “Guy” a mais energizada seiva do carvalho. Como para o antigo druida Brocellande era a transcendente morada de deuses e magos, foi perseguida pelo Cristianismo. Quando Carlos Magno pegou o domínio da França, antiga Gália, representando a Igreja, mandou queimar uma grande quantidade de carvalhos de Paimpont para exterminar tais cultos.


Tumba do mago Merlin
na floresta de Paimpont.
   Ali, hoje, o turista encontra placas com indicações para o “Vale sem Retorno”. Ele nos leva novamente às personagens arturianas. Na Idade Média, muito homem crédulo e infiel não entrava nele. Segundo a lenda, ali a fada Morgana, meia irmã de Artur, espera todos os amantes infiéis e os empurra para o fundo de um precipício. Assim se vinga de ter sido traída  em seus amores.

   Durante todos os momentos que ali permaneci em Paimpont, minha alma se gratificava por ter conduzido ali um grupo consciente da imantação de fé que podia ainda hoje ser encontrada naquele local de tantas antigas devoções.

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

A beleza do cotidiano

“Era apenas uma flor qualquer,
uma flor de mato”.


Para a velha caminhando na calçada, nada dizia o barulho de martelos e guindastes levantando tijolo a tijolo o edifício da pequena cidade. Nem progresso dizia, nem desenvolvimento(palavra que  ela ouvia o povo tanto apregoar). Nada além de ruídos exasperantes, ruídos que mais magoavam seu corpo de anciã. Tampouco o buzinar dos carros ou seu passar veloz congregavam-na ao mundo evoluindo ao seu redor.

    Tudo nela era abandono, prenúncio de túmulo: o curvar de seu dorso buscando o caminho da terra, a frouxidão das mãos levando a bolsa sebosa e vazia de bens. Não pertencia à classe daquelas que de cabelos alvos e tratados, recebem dos netos: chinelos aveludados, lavandas cheirosas ou quaisquer outras espécies de afagos. Não. Fora mulher de viver rude, dolorido, de apenas dar-se, de estender o ventre generoso e de novo murcha-lo por tantas vezes, para dar tantas vidas à luz que já nem podia enumera-las; de servir em labutas pesadas a bem de alimentá-las. Cada filho agora em rumo distante ou ignorado. Como saber até se dentre os dois que restavam, era Pedro, o que trabalhava nos fornos da fabrica, ou José o que ia à pedreira o que lhe nascera primeiro?

    Mas, também, o que isso lhe importava? Só o que sentia mesmo eram a lassidão e a moleza de suas juntas, como se elas estivessem a desmanchar-se; dor aguda cada vez que tentava espichar-se; vazio no lugar da fronte quando queria reportar-se a fatos passados. Só a ruína de seu próprio corpo a devora-la. Tudo isto em seus olhos: dureza, falta de amanhã.


    Porém, surge o milagre do cotidiano! Não escolhe número de dores ou de anos vividos. Os olhos da velha repentinamente revestem-se em fulgor de entusiasmo, em ternura de gente afortunada! Passava ela justamente, lado a lado com o terreno abandonado, um dos poucos que o progresso da cidade poupara. Esquina onde o mato crescida selvagem, acrescido de galhos espinhosos que por ali todos usavam largar. Mas no meio dele estava a flor. Uma única flor balouçando perfeita, intocada. Simples. É singela. Flor que não serviria para ornamentar casa abastada. Sem nome que lhe desse qualquer dignidade, fosse Cravo, ou Dália. Era apenas uma flor qualquer. Flor de mato. A velha porém...

    Seu esforço foi heroico! Embrenhou-se por entre os galhos do terreno. Prendeu a saia em espinhos e ,levando-se em conta como eram fracas as pernas que a levavam, safou-se com vigor de mocidade.

    Seu objetivo era a flor. Pegá-la. Levá-la. O peito da velha arquejou ao alcançá-la. Tem–na agora por entre os dedos apertada. Novo esforço de retorno à calçada, com vitória nos olhos embaçados.  Se o contato com a flor lembra-lhe a maciez na pele dos tantos bebês que gerara, ou o carinho do primeiro namorado... Só ela sabe.

    Vai a velha com seu tesouro singelo, já a murchar-se contra o calor de seus dedos encarquilhados. Passos lentos mas rosto iluminado. Acaricia com ambas as mãos pétala por pétala a brandura da flor, talvez a única beleza que entre a sordidez de seu mundo, ela encontrou por acaso.